Este Blog retratará o descaso com a Defesa Civil no Brasil; a falta de políticas específicas; o sucateamento dos Corpos de Bombeiros; os salários baixos; a legislação ambiental benevolente; a negligência na fiscalização; os desvios de donativos e recursos; os saques; a corrupção; a improbidade; o crime organizado e a inoperância dos instrumentos de prevenção, controle e contenção. Resta o sofrimento das comunidades atingidas, a solidariedade consciente e o heroísmo daqueles que arriscam a vida e suportam salários miseráveis e péssimas condições de trabalho no enfrentamento das calamidades e sinistros que assolam o povo brasileiro.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

DESASTRES NATURAIS RONDAM O PLANETA

EDITORIAL CORREIO DO POVO, 28/12/2011

O mundo está enfrentando perigos potenciais e riscos iminentes de flagelos de grandes proporções. Mas o que mais preocupa é o despreparo para lidar com esses sinistros, que tendem a ser tornar cada vez mais frequentes. O alerta sobre esses graves problemas foi dado pela agência de desenvolvimento internacional da Grã-Bretanha.

A situação toda se agravou por conta de uma interrupção nas contribuições para um fundo preventivo a cargo dos países desenvolvidos. A crise nas maiores economias está fazendo com que o combate às catástrofes arrefeça. O fundo é uma iniciativa da Organização das Nações Unidas (ONU) e, atualmente, amarga um déficit de 130,5 milhões para o ano de 2012.

De acordo com estudiosos, a diminuição dos recursos disponíveis para serem empregados em obras e serviços de resolução de gargalos já gerou consequências indesejáveis em todo o globo. A esse fator podem ser atribuídos o tsunami e o terremoto ocorridos no Japão, os diversos tremores de terra na Nova Zelândia, as enchentes no Paquistão e nas Filipinas e a fome aguda no Chifre da África. Também a omissão foi responsável pelos acidentes radioativos registrados no Japão, na Usina de Fukushima Daiichi, em março de 2011. Peritos japoneses afirmaram que é preciso ampliar as medidas de segurança para evitar que fatos semelhantes voltem a acontecer, comprometendo a segurança mundial.

Os dramas humanos que derivam dos desequilíbrios naturais constituem variáveis que elevam o nível de desequilíbrio no planeta. Guerras, mortes, milhões de refugiados, escassez de alimentos, doenças, epidemias, tudo é motivo de preocupação para aqueles que se preocupam com a manutenção da paz e o estabelecimento de relações civilizadas entre as nações. É por isso que é preciso retomar as parcerias mediadas pela ONU para que os fenômenos naturais sejam administrados da melhor maneira possível.

sábado, 24 de dezembro de 2011

PREVENÇÃO COM MAIS RECURSOS

EDITORIAL CORREIO DO POVO 24/12/2011

Diz um velho ditado que a prevenção é o melhor remédio. Seguidamente, temos notícias de tragédias que decorrem de fenômenos naturais que a ação humana não poderia evitar. Contudo, em muitos outros casos, temos situações que a ação diligente dos gestores públicos e dos órgãos de fiscalização certamente teria sido eficiente. Não poucas vezes, temos a culpa marcada pela negligência, que é o caso em que alguém não faz o que deve e peca pela omissão.

Em Porto Alegre mesmo tivemos o caso de um estudante que faleceu em função de um choque elétrico recebido em uma parada de ônibus, na avenida João Pessoa. Há alguns anos, também na capital gaúcha, ocorreu o óbito de uma estudante de 18 anos quando uma marquise caiu por cima dela na mesma via. A impressão que se tem é que se os responsáveis por avaliar o prédio e fazer a manutenção elétrica do ponto de ônibus agissem no fiel cumprimento de suas funções, essas vidas não teriam perecido.

Mais recentemente, o país inteiro ficou chocado com as centenas de mortes que ocorreram com os desabamentos de terra no estado do Rio de Janeiro. Ficou evidente que as autoridades municipais não cumpriram corretamente suas atividades e não removeram as populações que fizeram suas moradias em área de risco.

Diante desse quadro, vem em boa hora o anúncio de que a Defesa Civil, que tem a função de atuar preventivamente contra flagelos naturais e sinistros, vai receber mais verbas do governo federal. A dotação orçamentária atinge mais de meio bilhão de reais, verbas que deverão ser empregadas para prevenir desastres de grandes proporções. Parte desse montante será usado para reconstruir áreas atingidas.

O contribuinte que quita corretamente seus tributos espera dos administradores bons serviços. Agir celeremente contra tragédias é um deles.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

MEMÓRIA POR ÁGUA ABAIXO


AROLDO MEDINA - Major da Brigada Militar. ZERO HORA, 20/12/2011

A atual Defesa Civil é uma instituição destinada a agir na prevenção de desastres ou imediatamente após a sua ocorrência, para socorrer as pessoas atingidas. Sua origem remonta há mais de 50 anos. Apesar da sua idade e importância, a estrutura de que dispõe no Brasil é pequena ao ser confrontada com o tamanho da sua missão e responsabilidade. Clama por mais atenção e socorro das autoridades governamentais constituídas.

A natureza do seu trabalho está na capacidade dos seus gestores em estar preparados para enfrentar qualquer adversidade global que atinja um grande número de pessoas, colocando a vida da população em risco. O preparo impõe ao gestor conhecer o problema valendo-se de um estudo científico. Este estudo precisa de uma base sólida de informações normalmente coletadas em fontes confiáveis que tenham estabilidade.

Em 2003, a equipe de gestores da Defesa Civil do Estado do Rio Grande do Sul, em parceria com a equipe de governo eletrônico da Procergs (Companhia de Processamento de Dados), desenvolveu um banco de dados online que registrava os principais dados relacionados aos desastres naturais ocorridos no Rio Grande do Sul, disponibilizando as informações, em um site criado na internet (defesacivil.rs.gov.br). Qualquer pessoa podia consultar, por exemplo, quais os municípios atingidos por granizo ou qualquer outro fenômeno meteorológico, no período especificado. Os órgãos de imprensa se valiam muito desse canal de informação.

Dispensável discorrer sobre a importância de manutenção desse histórico e dos dados estatísticos, para a realização de qualquer planejamento sério de resposta a desastres.

Ao longo de quatro anos (2003-2006), essa página da Defesa Civil do RS esteve em contínuo processo de evolução e aperfeiçoamento, ao ponto de provocar, em 2006, a visita ao Palácio Piratini (sede da Defesa Civil estadual) de um grupo de cientistas do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), interessados em adotá-la como modelo nacional. No período de (2007-2010), a página foi mantida e atualizada.

A nova página da Defesa Civil do RS, recentemente lançada, abandona um sistema de TI (Tecnologia de Informação) com oito anos de práxis, colocando no ar um novo site que se limita à divulgação de notícias a partir de 1º de janeiro de 2011, dispensando um rol de informações variadas que o banco disponibilizava para consulta de qualquer pessoa, desde 2003. Uma importante memória preservada em fotos e notícias foi completamente removida, além de outros dados que também foram por água abaixo.

Precisamos amadurecer politicamente e entender que certas informações produzidas num governo não são propriedade do governo, e sim, pela sua natureza, como é o caso da Defesa Civil, são informações de Estado. Portanto, sendo do interesse de toda a população, que não deve ser exposta a processos de disputas partidárias, teimosos em apagar memórias.

Felizmente, todos os dados armazenados na Procergs, órgão 100% confiável para guardar informações de Estado, em qualquer período, podem ser totalmente recuperados e democraticamente disponibilizados a todos. Basta apenas boa vontade política, que o governador Tarso Genro pode determinar.


SUMIÇO POLÊMICO. Defesa Civil ficou sem banco de dados em site. Informações voltarão a estar disponíveis na internet, diz atual administração - NILSON MARIANO, zero hora 20/12/2011

Quem for pesquisar o histórico da queda de granizo no site da Defesa Civil do Estado, para comparar com o bombardeio de gelo que assustou os gaúchos no dia 14, sairá frustrado. O banco de dados da instituição, com informações sobre desastres naturais acumuladas desde 2003, não está disponível no portal.

Na semana passada, ao ver as cenas de telhados perfurados por granizo do tamanho de uma maçã, o ex-coordenador da Defesa Civil (DC) no governo Germano Rigotto, major Aroldo Medina, consultou o site da instituição, mas não achou o banco de dados que ajudara a montar. Inconformado, lembrou que as informações são vitais para pesquisadores do clima, universidades e no planejamento para socorrer populações atingidas.

– Não são dados de um governo, mas, sim, de Estado. São indispensáveis na resposta adequada a um desastre, seja na prevenção ou na assistência – observou o oficial.

Medina contou que o banco de dados foi criado em 2003 pela equipe da DC, em parceria com a Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul (Procergs). Trazia informações sobre fenômenos meteorológicos, períodos de ocorrência e municípios castigados. Técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) visitaram o Palácio Piratini, em 2006, para conhecer a experiência.

Assunto leva gestores e ex-gestores a divergir

A atual administração da DC garante que o banco de dados voltará a ficar disponível no site. Chefe da Divisão de Administração e Comunicação Social da entidade, o major Ari Ferreira explicou que houve necessidade de trocar o portal, porque o anterior estava obsoleto, não comportava mais as atualizações. Com a mudança, constatou-se que o banco de dados antigo era incompatível com o novo sistema.

O major Ferreira assegurou que as informações estão sendo reinseridas gradualmente. Do total de 1 milhão de dados, cerca de 600 mil – a maioria sobre o volume e a distribuição da chuva – estão disponíveis. A intenção é terminar a migração em 30 dias.

– Nós mesmos temos cobrado da nossa equipe técnica a volta do banco de dados – disse o oficial.

O chefe da Divisão de Administração e Comunicação Social acrescentou que também houve dificuldades no início das operações, porque gestores do governo anterior teriam “esquecido” de repassar a senha. Responsável pela DC na administração Yeda Crusius, o major Aurivan Chiochetta negou a insinuação.

– Quem passou as informações fui eu. E nada foi sonegado. Elas não pertenciam a mim, mas ao povo, aos municípios, ao Estado. Tudo foi disponibilizado – afirmou Chiochetta.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

TRAGÉDIAS E OMISSÕES


EDITORIAL ZERO HORA 19/12/2011

A confissão do ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aloizio Mercadante, de que o governo federal ainda não adotou todas as providências capazes de evitar mortes em enxurradas e deslizamentos no período de chuvas intensas que se aproxima, deveria ser feita também por muitos governadores e prefeitos. Todas as esferas da administração pública, e não só a União, foram demasiadamente lentas na adoção de medidas preventivas, depois das tragédias dos últimos anos. Disse o ministro que, em decorrência das chuvas, “morrerão pessoas neste verão”, sem que o governo possa interferir de forma mais efetiva em áreas de risco.

Mesmo que se reconheça que nenhum governo será capaz de evitar todas as tragédias com acidentes naturais, as autoridades poderiam trabalhar no sentido de atenuar seus efeitos. As áreas de alto risco são conhecidas e independem de mapeamentos, como os que vêm sendo realizados por vários órgãos. As prefeituras sabem onde há moradores em regiões sujeitas a desmoronamentos. Os Estados também dispõem de informações, mesmo que parciais, sobre esses locais. Claro que ações mais drásticas dependem da retirada dessas pessoas, com custos financeiros e sociais. Mas já deveriam ter sido tomadas providências no sentido de evitar maiores danos.

Pelo que se percebe, pouco tem sido feito. O Brasil, conforme o anúncio franco do ministro, pode se preparar então para lamentar tragédias e, logo depois, ouvir promessas e discursos e ser apresentado a planos que nunca serão totalmente executados. O Brasil é pródigo na formulação de projetos grandiosos logo depois de eventos traumáticos, como os ocorridos com as chuvaradas de 2008 em Santa Catarina, de 2009 na Amazônia, 2010 em Alagoas e Pernambuco e no início deste ano na região serrana do Rio. Mais de mil pessoas morreram nesses Estados. Logo depois da tragédia no Rio, o governo anunciou com pompa a criação do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), que deveria estar funcionando a partir de novembro último. O diretor do Centro, Reinhardt Adolfo Fuck, admite que a estrutura ainda é precária e que o órgão somente estará em plena atividade daqui a um ano.

O Cemaden é um exemplo de que as urgências são esquecidas logo depois das mortes provocadas por catástrofes climáticas. Este ano, o Centro dispôs de apenas R$ 2,2 milhões de um orçamento previsto de R$ 21 milhões. A burocracia derrotou as boas intenções que levariam à criação de um sistema de prevenção com radares meteorológicos, satélites e outras formas de monitoramento. Com tanto atraso na área federal, agravado por omissões estaduais e municipais, dificilmente será cumprida a meta do ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, de reduzir pela metade, num prazo de quatro anos, o número de vítimas de desastres naturais. Faltam equipamentos e profissionais, diz o governo. Para a população, o que falta mesmo é seriedade dos governos com seus próprios compromissos e prioridades.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O RIO, O CÓDIGO E O DESCASO...


DÉLTON WINTER DE CARVALHO, PROFESSOR DE DIREITO AMBIENTAL E ADVOGADO - ZERO HORA 14/12/2011

A situação do Rio dos Sinos é desesperadora! No entanto, a estiagem, como fenômeno climático adverso, nos mostra que muito mais frágil é a situação do homem frente a tais adversidades. A natureza é impiedosa com hóspedes agressivos. As mudanças climáticas globais agravam o cenário. Apesar de servir de grande comoção social, a questão ambiental do Rio dos Sinos volta a ocultar suas reais causas, desviando a energia coletiva para a procura de “culpados”, destinados a uma execração em praça pública para alívio da sociedade vítima. Antes de qualquer aprofundamento na ponderação sobre o problema do Rio dos Sinos ou qualquer recurso hídrico que esteja agonizando, temos que considerar que estes se tratam, sob o ponto de vista jurídico e humano, de bens públicos de uso comum. Isto é, em razão de sua essencialidade à vida humana e demais formas de existência, são inalienáveis e indisponíveis. Cabe ao poder público, orientado pelos comitês de bacia, a gestão do seu uso, devendo, sempre, garantir acesso a todos, de maneira sustentável e democrática.

É impossível, contudo, falarmos de água sem citar a vegetação, pois é ela que protege a primeira, exercendo serviços ambientais, tais como a fixação das margens, o combate à erosão e ao assoreamento do rio, a proteção contra impactos diretos, maior evaporação da água. Os banhados, tão agredidos nas margens do Rio dos Sinos (pela ocupação “regular” e irregular urbana), atuam como verdadeiras barragens naturais em épocas de cheia, absorvendo a água abundante, que será devolvida gradualmente ao curso d’água no período de calor. Hoje, o Sinos é um grande canal artificial, bloqueado por diques e muros que ocasionam inundações no inverno chuvoso e, diante dos primeiros indícios de calor veranil, seca impiedosamente. Claro, a água não teve o devido lugar para ser armazenada e filtrada!

Ao invés de barragens e outras obras de infraestrutura “cinza”, o que o rio precisa é da recuperação imediata de sua “infraestrutura natural”, mais barata e eficaz. Outro ponto importante consiste na estrutura institucional. A legislação federal (Lei nº 9.433/97) orienta a organização política das águas sob a lógica de que as bacias hidrográficas detêm um parlamento, chamado de comitê de bacias. Porém, estes jamais serão eficazes ou sairão do plano dos debates sem uma agência reguladora forte, capaz de executar as políticas públicas da água. Em nível local, o Rio Grande do Sul conta apenas com um departamento estadual, jamais tendo criado sua agência. Em nível nacional, o Senado acaba de aprovar um novo Código Florestal, que, na contramão da História, reduz a proteção jurídica sobre as áreas de florestas nas margens de rios. É hora de decidir qual compromisso vamos assumir com o futuro...

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

PROTESTO DOS SALVA-VIDAS

WANDERLEY SOARES, REDE PAMPA, O SUL
Porto Alegre, Terça-feira, 13 de Dezembro de 2011.


As diárias com que são contemplados os brigadianos beiram o ridículo.

Nesta quinta-feira, dia 15, a partir das 9h, haverá um movimento para a doação de sangue em massa ao Hemocentro Partenon. PMs salva-vidas da Operação Golfinho e demais servidores de nível médio da Brigada Militar estarão reunidos num protesto solidário pela valorização dos salva-vidas.

A ASSTBM (Associação dos Sargentos, Subtenentes e Tenentes da Brigada Militar) promoverá esse movimento a fim de chamar a atenção da sociedade gaúcha para a situação degradante a que estão expostos esses PMs.

No mês de novembro, a entidade protocolou no Palácio Piratini um ofício solicitando aumento nos valores das diárias. Atualmente, o governo oferece ao brigadiano 57 reais para alimentação, hospedagem e demais despesas. Assim, a possibilidade de desistência dos salva-vidas da Operação Golfinho é iminente.

Outra questão é a necessidade de haver atendimento médico de urgência e ambulância à disposição nos treinamentos para um socorro imediato. A morte do soldado Rafael Pereira durante treinamento em Cidreira trouxe à tona um problema antigo que nenhum governo que passou pelo Piratini resolveu. Nesse protesto são esperados mais de 200 policiais militares, 50% do efetivo de salva-vidas, além de familiares e a sociedade em geral solidária à causa. Isso indica que no dia 16 de dezembro, data em que os servidores devem apresentar-se para as atividades da Operação Golfinho, existe a possibilidade dos brigadianos se recusarem a prestar este serviço nas praias, caso o governo não reajuste o valor das diárias de 57 reais para cem reais.

Há décadas os brigadianos vêm enfrentando situações precárias no litoral, mas sem nunca abrir mão da sua missão de salvar vidas, mesmo com o descaso do governo que os submete a condições desumanas durante todo o verão. Sigam-me

Tremor

A situação dos salva-vidas é emblemática, pois dá uma ideia perfeita sobre o que o atual governo e os anteriores entendem como prioridade na área da segurança pública. Não obstante as escorregadias explicações procedentes da política da transversalidade que verte do Piratini, é inquestionável que enquanto houver necessidade de tal tipo de reivindicação, a insegurança no Estado fará tremer, em primeiro plano, as próprias bases da segurança pública.

domingo, 11 de dezembro de 2011

O BRASIL DAS CALAMIDADES

GAUDÊNCIO TORQUATO, JORNALISTA, PROFESSOR TITULAR DA USP, É CONSULTOR POLÍTICO DE COMUNICAÇÃO- O Estado de S.Paulo - 11/12/2011

O chiste é conhecido. Ao criar o mundo, Deus distribuiu as catástrofes pela Terra, enquanto comentava com o anjo ao seu lado: "Aqui eu vou localizar os EUA, com seus terremotos e furacões; ali vai ser a Europa, que vai ter também vulcões e terremotos; acolá vou instalar a Ásia, com desertos, terremotos e tsunamis". Curioso, o anjo indagou: "E nesse local vai pôr o quê?" Deus respondeu: "Aqui será o Brasil". Insistiu o arcanjo: "E ele não vai ganhar catástrofes naturais?" A resposta divina: "Não, de jeito nenhum, mas você vai ver os políticos que eu vou botar lá". Ou a versão sobre a criação do mundo não é correta ou a galhofa sobre o Brasil não resiste aos solavancos da natureza neste início de século 21. Pois os nossos trópicos começam a frequentar o ranking das grandes catástrofes do planeta.

Em janeiro, o País registrou o maior desastre climático de sua existência, na Região Serrana do Rio de Janeiro, que contabilizou 820 mortos. Foi o oitavo pior deslizamento de terras da História mundial. O ano chega ao fim com o grave acidente no poço da Chevron no Campo de Frade (Bacia de Campos, RJ), que derramou no mar 440 mil litros de petróleo. De desastre em desastre e milhares de vítimas, vivenciando incidentes que deixam marcas profundas na anatomia de cidades e regiões, o Brasil já não é o território seguro tão admirado em comparação com outras nações. Seu mapa faz parte da geografia de vorazes predadores da natureza. Quando se efetivar a extração de óleo do pré-sal, ganharemos o título de terceiro maior poluidor do mundo, ficando apenas atrás dos EUA e da China.

Subimos celeremente no ranking da poluição. A planilha de calamidades se adensa. Em 2010 a Petrobrás, empresa orgulho da Nação, bateu o recorde de autos de infração, registrando 57 vazamentos. O volume de petróleo e derivados derramado cresceu 163%, pulando de 1.597 mil barris em 2009 para 4.201 mil espalhados na natureza no ano passado. Pairam ameaças por todos os lados. Na semana passada, um supercargueiro da Vale, ao ser carregado com 385 mil toneladas de minério de ferro no porto de São Luís (MA), exibia rachaduras no tanque de lastro. Despejada no mar, essa carga causaria tragédia sem precedentes em nossa costa.

Na paisagem devastada por acidentes/incidentes, muitos dos quais resultam de incúria, a nota de destaque: o Brasil não dispõe de um plano de contingência para administrar catástrofes. A cada evento, seja um temporal arrasador, o vazamento de óleo de um poço ou uma epidemia de dengue, como a que se prenuncia em cerca de 300 cidades, as providências revelam traços de improvisação. Mas não faltam discursos conflitantes, passeios de autoridades por destroços, uma ou outra verba liberada para dourar a imagem dos governos de plantão e multas que não se sabe quando e como serão pagas pelos responsáveis.

O País é useiro e vezeiro na arte de improvisar soluções para suas tragédias. Todos os anos as mesmas regiões sofrem com enchentes e enxurradas, principalmente Santa Catarina, Rio Grande do Sul e cidades serranas do Rio. As mortes e o número de acidentados se expandem. As rotinas se banalizam. Após os impactos físicos e emocionais, a vida volta ao normal e as populações passam a conviver com obras de recuperação, as quais, com raras exceções, não vão ao cerne dos problemas. As calamidades tornarão a acontecer.

Se não dispomos de programas (robustos) para administrar os previsíveis eventos de nossas estações climáticas, imagine-se o caos que um acidente nuclear poderia gerar. É lorota argumentar que nossas usinas são seguras e confiáveis. Não era seguro o reator 4 da central nuclear de Chernobyl, que, ultrapassando o nível de aquecimento, explodiu e liberou uma nuvem radioativa sobre a ex-União Soviética e a Europa Oriental, em 1986, matando milhares de pessoas? Dois anos antes, em Bhopal, na Índia, um vazamento de 42 toneladas de isocianato de metila de uma fábrica, em contato com a atmosfera, ceifou a vida de 20 mil pessoas e de milhares de animais. O Brasil saberia administrar um acidente nuclear na região de Angra dos Reis? Se alguém responder positivamente, estará cometendo um desatino. Não sabemos lidar com tragédias.

Em face do potencial brasileiro na exploração do petróleo (9 mil poços em operação em mar e terra e perspectiva de produzir 6 milhões de barris diários até 2020) e tendo em vista a perspectiva do pré-sal, é razoável prever que os riscos iminentes se localizam nesses campos. Esse episódio provocado pela americana Chevron remete ao maior desastre ambiental da História dos EUA, em abril do ano passado, quando 172 milhões de galões de óleo foram despejados no Golfo do México, ocasionando prejuízos materiais e ambientais inestimáveis.

Dessa teia de eventos terríveis sobra para as nossas autoridades o conselho de redobrar a atenção. Urge não apenas planejar sistemas de prevenção, mas fazer mapeamento minucioso das frentes consideradas de risco (alto, médio e pequeno) em todos os espaços do território nacional. Há uma pletora de estruturas com responsabilidades sobre os espaços de risco - agências reguladoras, órgãos de controle ambiental nas instâncias federal, estaduais e municipais, ministérios e frentes de defesa civil, etc. Ressente-se de clareza normativa e operacional para tais órgãos. Quem coordena o que e quem? Como é sabido, são comuns entre nós duplicações de estruturas e consequentes acusações recíprocas de culpa. Os governantes, por sua vez, desenvolvem certa ojeriza a ações que não dão voto, como planos de prevenção, obras escondidas (saneamento básico), códigos de controle ambiental ou conceitos abstratos como desenvolvimento sustentável.

De tropeço em tropeço, a imagem do éden, que nos é impingida desde que Cabral, deslumbrado, arregalou os olhos para a exuberância de nossa natureza, se esgarça na fumaça destes tempos cada vez mais catastróficos.