Este Blog retratará o descaso com a Defesa Civil no Brasil; a falta de políticas específicas; o sucateamento dos Corpos de Bombeiros; os salários baixos; a legislação ambiental benevolente; a negligência na fiscalização; os desvios de donativos e recursos; os saques; a corrupção; a improbidade; o crime organizado e a inoperância dos instrumentos de prevenção, controle e contenção. Resta o sofrimento das comunidades atingidas, a solidariedade consciente e o heroísmo daqueles que arriscam a vida e suportam salários miseráveis e péssimas condições de trabalho no enfrentamento das calamidades e sinistros que assolam o povo brasileiro.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

CRIMES POSSÍVEIS NO CASO DO INCÊNDIO DA BOATE

G1 - 31/01/2013 14h17

Entenda os crimes possíveis no caso do incêndio da boate em Santa Maria. Ao G1, criminalistas explicam quais são os crimes e quem pode ser punido. Incêndio em boate deixou mais de 230 mortos no domingo (27).

Glauco Araújo e Rosanne D'AgostinoDo G1, em São Paulo




O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, deixou mais de 230 mortos na madrugada de domingo (27). O G1 ouviu especialistas para explicar quais são os possíveis crimes no caso e quem poderia ser acusado e punido.

Segundo os criminalistas, o Código Penal pune o indivíduo por condutas proibidas e não responsabiliza a casa noturna ou a prefeitura, por exemplo.

Ou seja, é preciso provar que determinada pessoa praticou uma ação (com ou sem intenção), que provocou um resultado que está previsto na lei como crime. Essa conduta proibida precisa ter relação direta ou indireta com a produção do resultado, no caso, o incêndio e as mortes.

Como as investigações ainda não foram finalizadas, os especialistas comentaram o caso em tese e apresentam as hipóteses mais prováveis até o momento.

Veja a seguir os crimes possíveis no caso do incêndio em Santa Maria, o que é necessário para a acusação, as opiniões e interpretações para cada um e as consequências:

HOMICÍDIO - 1ª hipótese

- CULPOSO (sem intenção): é a hipótese mais provável para os especialistas. É preciso que alguém tenha agido com imprudência (prática de um fato perigoso), negligência (não toma devidas precauções) ou imperícia (falta de aptidão técnica) e que essa ação esteja ligada ao incêndio e às mortes.

“Vai surgir uma discussão se o comportamento de cada um acabou dando causa ou colaborou para o resultado dessas mortes”, afirma o professor em Direito Penal e advogado Leonardo Pantaleão. “Precisa verificar se houve a culpa por uma dessas modalidades e qual o grau de responsabilidade de cada um.”

“Entendo que foi de maneira culposa, por negligência, imperícia ou imprudência, que são modalidades de culpa. A análise precisa ser técnica e aí vai precisar de laudo, de perícia, de investigação”, disse Elias Matar Assad, presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas.

“Tem que mostrar que não observaram o dever de cautela. E só é acusado se cabia a essa pessoa tomar essa providência e se ficar provada a ciência dela do risco”, diz Camila Austregesilo Vargas do Amaral, especialista em Direito Penal pela Universidade de Coimbra.

"O risco de se cometer injustiças é muito grande. Ninguém causou a tragédia propositadamente. Muitas pessoas estão na periferia da tragédia, não necessariamente de forma criminosa", complementa Fábio Tofic Simantob, diretor do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.

Quem pode ser acusado?

- Donos da boate: se ficar comprovado que eles sabiam do risco de incêndio e ainda assim permitiram as apresentações com efeitos pirotécnicos no local.

- Vocalista da banda: se ficar comprovado que ele sabia estar utilizando um sinalizador capaz de provocar um incêndio, de forma imprudente.

- Responsável pela segurança da banda: se ficar comprovado que ele tinha consciência de que os efeitos pirotécnicos usados no show poderiam causar um incêndio. Pode ter uma pena maior porque a inobservância de regra técnica da profissão é causa de aumento de pena.

PENAS: é aplicado o concurso formal (uma conduta que causa vários crimes). Os réus não respondem por 235 mortes. A pena é pelo crime de homicídio, aumentada de um sexto até metade. A pena por homicídio culposo é de detenção, de um a 3 anos. Também contam atenuantes, como ser réu primário, ou causas de aumento de pena.

HOMICÍDIO - 2ª hipótese

- DOLO EVENTUAL (o agente assume o risco): hipótese controversa e pouco provável para os especialistas. Nesse caso, alguém teria que ter agido sabendo do risco de incêndio, mas acreditando que não fosse ocorrer, atuando com indiferença.

“É claro que os integrantes da banda não tinham como prever esse risco, porque eles estavam lá dentro. É disparatado, não faz sentido nenhum”, afirma Camila.

“Em nenhum momento houve uma assunção do risco efetivo. O que aconteceu foi uma imprudência, é uma característica de culpa. Eu acho que não se consegue comprovar, tecnicamente. É caracterizado no pior cenário, um homicídio culposo”, diz Pantaleão.

"Longe de querer dizer que um crime como esse vá ficar impune. Acho que todos esses fatores jurídicos precisam ser bem analisados para que a resposta penal não seja apenas uma resposta para a sociedade", afirma Tofic.

“Entendo que foi de maneira culposa, por negligência, imperícia ou imprudência, que são modalidades de culpa”, afirma Assad. “Poderá também alguém entender que houve dolo eventual porque não havia extintor, porque o teto foi rebaixado, porque foi usado plástico ou espuma inadequada na cobertura, enfim, mas isso depende de perícia”, completa.

PENAS: é a pena do homicídio doloso (com intenção), de 6 a 20 anos, também dosada de acordo com atenuantes, como ser réu primário, agravantes ou causas de aumento de pena.

INCÊNDIO

- CULPOSO: causar incêndio sem intenção, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de alguém. Não é citada por todos os especialistas como hipótese de crime no caso. É preciso que o causador do incêndio tivesse consciência do risco e tenha agido com imprudência, negligência ou imperícia.

“Depende do resultado da perícia. Se os produtos inflamáveis não estivessem lá, teria ocasionado o incêndio? Os proprietários sabiam que seria usados os fogos e que existia risco do incêndio? Precisa saber as duas coisas”, afirma Camila.

"O crime de incêndio desaparece diante do homicídio, principalmente pelo volume de mortes. Esse crime acaba sendo absorvido pelo crime principal", argumenta Tofic.

Quem pode ser acusado?

- Donos da boate: se ficar comprovado que eles sabiam do risco de incêndio com o uso de efeitos pirotécnicos no local.

- Vocalista da banda: se ficar comprovado que ele sabia estar utilizando um sinalizador capaz de provocar um incêndio, de forma imprudente.

- Responsável pela segurança da banda: se ficar comprovado que ele tinha consciência de que os efeitos pirotécnicos usados no show poderiam causar um incêndio. Pode ter uma pena maior porque a inobservância de regra técnica da profissão é causa de aumento de pena.

PENAS: detenção, de seis meses a dois anos.

LESÃO CORPORAL

- CULPOSA: há divergência se houve lesão corporal por haver vítimas feridas internadas em hospitais.

“Homicídio culposo e lesão corporal culposa eu não tenho dúvida que são crimes configurados neste caso”, defende Assad. “Entendo que foi de maneira culposa. (...) Se estabelecerem que ocorreu homicídio doloso, aí poderia ter o entendimento de tentativa de homicídio também, mas acho mais difícil.”

“Não é lesão corporal, porque a gente tem uma regrinha no direito que, quando há uma conduta gerando resultados diferentes, a pena é calculada sobre o resultado mais grave, que foi a morte. É pena de homicídio, aumenta com base no concurso formal”, discorda Pantaleão.

“Só pode ser incluído no homicídio se houver o resultado morte. Se não, é na lesão corporal”, afirma Camila.

Quem pode ser acusado?

- Donos da boate: se ficar comprovado que eles sabiam do risco de incêndio.

- Vocalista da banda: se ficar comprovado que ele sabia estar utilizando um sinalizador capaz de provocar um incêndio, de forma imprudente.

- Responsável pela segurança da banda: se ficar comprovado que ele tinha consciência de que os efeitos pirotécnicos usados no show poderiam causar um incêndio. Pode ter uma pena maior porque a inobservância de regra técnica da profissão é causa de aumento de pena.

PENAS: detenção, de 2 meses a 1 ano, também em concurso formal.

BATALHÃO AMBIENTAL FEZ VISTORIA UM MÊS ANTES

G1 RS 30/01/2013 21h51

Brigada Militar fez vistoria em boate um mês antes de incêndio. Batalhão Ambiental inspecionou o local no dia 26 de dezembro de 2012. Parecer aprovando a boate Kiss foi emitido em 18 de janeiro de 2013.

Caetanno Freitas Do G1 RS



Fachada da boate Kiss na tarde de segunda (28)
(Foto: Ricardo Moraes/Reuters)

A boate Kiss, que foi atingida por um incêndio no último domingo (27) durante uma festa universitária em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, passou por vistoria da Brigada Militar um mês antes da tragédia que matou 235 pessoas. Na ocasião, o Batalhão Ambiental foi verificar se o isolamento acústico estava dentro das normas exigidas para que a casa não fosse multada por poluição sonora. Além disso, o Ministério Público confirmou ao G1nesta quarta-feira (30) que recebeu um parecer favorável do órgão nove dias antes do incêndio.

Segundo o comandante do 2º Batalhão Ambiental da Brigada Militar, major Luiz Antônio Floresta, um relatório aprovando as condições sonoras da casa foi emitido no dia 26 de dezembro de 2012. O motivo da vistoria eram as frequentes reclamações de moradores perturbados pelo barulho emitido à noite pela boate. “Na ocasião, apesar das denúncias, não foi constatado nenhum tipo de problema, nenhum ruído excessivo durante a festa”, informou o major ao G1. Após essa data, o MP procurou o órgão e foi informado, no dia 18 de janeiro de 2013, que a situação estava regularizada.


Apesar da vistoria, Floresta explica que a polícia ambiental não é responsável por avaliar o tipo de material utilizado para o isolamento acústico. Segundo ele, qualquer produto poderia ter sido usado e o estabelecimento seria aprovado desde que o som não ultrapassasse o limite mínimo de 30 decibéis entre às 22h e 5h. “Nós não analisamos o material em si, não temos competência para isso. Nossa equipe avalia o ruído através do sonômetro. Foi isso que fizemos, nada mais.”

O MP abriu um inquérito civil em 2011 para apurar denúncias de poluição sonora na boate Kiss. Durante a investigação, ficou constatado que a casa não oferecia nenhum tipo de revestimento acústico. Em fevereiro de 2012 foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) onde os proprietários garantiram ter instalado uma espuma de isolamento, cumprindo a exigência do MP. Ou seja, o revestimento que acelerou o processo de combustão na boate e que foi considerado inadequado pelo delegado regional de Santa Maria Marcelo Arygoni foi alojado depois da inspeção do Corpo de Bombeiros e antes da renovação do Plano de Prevenção e Combate a Incêndios, prestes a ser renovado.

O comandante do Corpo de Bombeiros de Porto Alegre, Adriando Krukoski, que foi até Santa Maria avaliar a situação da boate, confirmou a versão em entrevista coletiva na manhã desta quarta-feira no Centro da capital gaúcha. Segundo ele a nova vistoria para liberar o PPCI não foi realizada. “O alvará da boate venceu em agosto. Em setembro os bombeiros alertaram o vencimento e em novembro eles pediram nova inspeção. Tudo indica que essa espuma tenha sido colocada por exigência do MP por causa de uma ação de poluição sonora e que ela tenha sido instalada nesse intervalo de tempo.”


A perícia ainda não informou o tipo de material utilizado no isolamento acústico, mas relatos de sobreviventes apontam que a espuma usada pegou fogo muito rápido. A Lei Municipal 3301/91, datada de 22 de janeiro de 1991, diz, no artigo 17: “É vedado o emprego de material de fácil combustão e/ou que desprenda gases tóxicos em caso de incêndio, em divisórias, revestimento e acabamentos” em “estabelecimentos de reunião de público, cinemas, teatros, boates e assemelhados”.

Entenda

O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, região central do Rio Grande do Sul, deixou 235 mortos na madrugada do último domingo (27). O fogo teve início durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira, que fez uso de artefatos pirotécnicos no palco. De acordo com relatos de sobreviventes e testemunhas, e das informações divulgadas até o momento por investigadores, é possível afirmar que:

- O vocalista segurou um artefato pirotécnico aceso.
- Era comum a utilização de fogos pelo grupo.
- A banda comprou um sinalizador proibido.
- O extintor de incêndio não funcionou.
- Havia mais público do que a capacidade.
- A boate tinha apenas um acesso para a rua.
- O alvará fornecido pelos Bombeiros estava vencido.
- Mais de 180 corpos foram retirados dos banheiros.
- 90% das vítimas fatais tiveram asfixia mecânica.
- Equipamentos de gravação estavam no conserto.

Prisões


Quatro pessoas foram presas na segunda por conta do incêndio: o dono da boate, Elissandro Calegaro Spohr; o sócio, Mauro Hofffmann; o vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo Santos; e um funcionário do grupo, Luciano Augusto Bonilha Leão, responsável pela segurança e outros serviços.

Investigação

O delegado Marcos Vianna, responsável pelo inquérito do incêndio na boate Kiss, disse ao G1 na terça-feira (29) que uma soma de quatro fatores contribuiu para a tragédia ter acabado com tantos mortos: 1) o fato de a boate ter só uma saída e a porta ser de tamanho reduzido; 2) o uso de um artefato sinalizador em um local fechado; 3) o excesso de pessoas no local; e 4) a espuma usada no revestimento, que pode não ter sido a mais indicada e ter influenciado na formação de gás tóxico.


O delegado regional de Santa Maria, Marcelo Arigony, afirmou também na terça que a Polícia Civil tem "diversos indicativos" de que a boate estava irregular e não podia estar funcionando. "Se a boate estivesse regular, não teria havido quase 240 mortes", disse em entrevista. "Mas isso ainda é preliminar e precisa ser corroborado pelos depoimentos das testemunhas e os laudos periciais", completou.

Arigony disse ainda que a banda Gurizada Fandangueira utilizou um sinalizador mais barato, próprio para ambientes abertos e que não deveria ser usado durante show em local fechado. "O sinalizador para ambiente aberto custava R$ 2,50 a unidade e, para ambiente fechado, R$ 70. Eles sabiam disso, usaram este modelo para economizar. Usaram o equipamento para ambiente aberto porque era mais barato”, disse o delegado.

O vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo Santos, admitiu em seu depoimento à Polícia Civil que segurou um sinalizador aceso durante o show, de acordo com o promotor criminal Joel Oliveira Dutra. O músico disse, no entanto, que não acredita que as faíscas do artefato tenham provocado o incêndio. Ele afirmou que já havia manipulado esse tipo de artefato por diversas vezes em outras apresentações.

Responsabilidades

A boate Kiss desrespeitou pelo menos dois artigos de leis estadual e municipal no que diz respeito ao plano de prevenção contra incêndio. Tanto a legislação do Rio Grande do Sul quanto a de Santa Maria listam exigências não cumpridas pela casa noturna, como a instalação de uma segunda porta, de emergência. A boate situada na Rua dos Andradas tinha apenas uma, por onde o público entrava e saía. Outra medida que não foi cumprida na estrutura da boate diz respeito ao tipo de revestimento utilizado como isolamento acústico.

A Brigada Militar informou nesta quarta que a boate não estava em desacordo com normas de prevenção contra incêndios em relação ao número de saídas. Segundo interpretação da lei, o local atendia as normas ao possuir duas saídas no salão principal. Mas as portas, no entanto, não davam para a rua, e sim para um hall. Este sim dava para a rua através de uma só porta. "Foi um ato possível que o engenheiro conseguiu colocar", disse o tenente coronel Adriano Krukoski, comandante do Corpo de Bombeiros de Porto Alegre.

Jader Marques, advogado de Elissandro Spohr, um dos sócios da boate, disse que a casa noturna estava em "plenas condições" de receber a festa. Ele falou sobre documentação da casa, segurança, lotação, e disse que a banda Gurizada Fandangueira não avisou que usaria sinalizadores naquela noite. O advogado ainda afirmou que o Ministério Público vistoriou o local "diversas vezes".

A Prefeitura de Santa Maria se eximiu de responsabilidade pelo incêndio e entregou alvará para a polícia que mostra data de validade de inspeção para prevenção de incêndio, feita pelo Corpo de Bombeiros. A prefeitura afirma que a sua responsabilidade era apenas sobre o alvará de localização, que é válido com a vistoria do ano corrente. O documento informa que a vistoria foi feita em 19 de abril de 2012.

O chefe do Estado Maior do 4º Comando Regional do Corpo de Bombeiros, major Gerson Pereira, disse na quarta que a casa noturna tinha todas as exigências estabelecidas pela lei vigente no Brasil. "Quem falhou, que assuma a sua responsabilidade. Nós fizemos tudo o que estava ao nosso alcance e não vou entrar em jogo de empurra-empurra", afirmou.

O Ministério Público do Rio Grande do Sul abriu um inquérito civil na terça para investigar a possibilidade de improbidade administrativa por parte de integrantes da Prefeitura de Santa Maria, do Corpo de Bombeiros e de outros órgãos públicos por terem permitido que a boate Kiss continuasse funcionando mesmo com as licenças de operação e sanitária vencidas.






COM LICENÇA, OUTRO PALPITE

FOLHA DE  SÃO PAULO 31/01/2013

Janio de Freitas

A facilidade com que os jornalistas brasileiros podemos distribuir culpas, sem maior verificação nem menor reflexão, mais conturba do que ajuda a consertar os desarranjos nacionais. A tragédia de Santa Maria reproduz vários exemplos nesse sentido.

Como sempre em dramas e tragédias municipais, foi posta imediatamente uma corda no pescoço do prefeito local. Problemas com a fiscalização e as consequentes licenças para atividade da boate. Não há dúvida de que o problema existe, por parte da prefeitura ou do Corpo de Bombeiros.

Mas será mesmos aos prefeitos que cabem a tarefa e a responsabilidade de fiscalizar, a meio dos seus afazeres, boates e prédios em geral? Enquanto, desde a tragédia, o prefeito se desdobra em entrevistas e explicações, o nome do responsável pelo departamento municipal de fiscalização nem sequer entrou no noticiário. Deveria ser o primeiro procurado para explicar a situação das relações legais entre as características da boate e o cumprimento, ou não, das responsabilidades exigidas a respeito, tanto da casa como do setor de fiscalização.

Houve, de início, licenciamento correto? As fiscalizações periódicas foram realizadas como exigido, resultando em liberação ou em exigências? Em caso negativo, o que o causou? Quem fez cada uma das fiscalizações, se foram feitas? E, como estamos no Brasil, se as respostas foram insatisfatórias, as condições de vida e de bens do pessoal de fiscalização são compatíveis com a remuneração?

Mais ou menos o mesmo deveria estar feito quanto aos bombeiros e a alegada "análise" que desde 19 de outubro impediu a aprovação ou reprovação da boate. Cá por mim, já vi numerosas inspeções de bombeiros em áreas de risco, como setores gráficos com todos os seus inflamáveis, e a prática dos inspetores nunca exigiu mais do que observação objetiva, para exigência ou breve produção de laudo aprobatório. O que havia na boate a ser tão "analisado"? Não foi perguntado nem dito. Mas a resposta existe: nada, nem mesmo as bebidas duvidosas e as poeiras animadoras, capaz de exigir três meses de análises.

Com a investida sobre o prefeito, seus congêneres e governadores providenciam fiscalizações urgentes nos seus arraiais. Não adiantam de nada, mas dão algum sossego e notícias favoráveis. Para levar ao efeito necessário, todas as fiscalizações de segurança têm de ser feitas a qualquer tempo, sem aviso, e não só na ocasião dos relicenciamentos. As alterações feitas depois das fiscalizações são regra geral em empreendimentos sujeitos a inspeção. Depois se ajeitam as coisas, que jeitinho é para isso, na futura fiscalização.

Também sem haver alguma ordenação no lado das prefeituras e dos governos, nada melhorará na insegurança. São pelo menos três, e com frequência bem mais, os setores do poder público responsáveis pelas condições proporcionadas ao público, por exemplo, nas casas de diversão: prefeitura, Corpo de Bombeiros e Polícia Militar. Quando não, também, as áreas de meio ambiente, de saúde pública, de trânsito e de plano urbanístico. Cada um agindo ou não agindo por si. A irracionalidade é um dos nossos patrimônios nacionais, mas sem alguma racionalização nessa balbúrdia, nada feito. Muito menos a pretendida criação de mais leis, já comentada ontem na Folha pela atenção ininterrupta de Fernando Rodrigues.

Bem, alguma coisa sempre é feita, sim. O governo Alckmin decidiu fiscalizar todas as casas noturnas com mais de 1.000 m². Pronto. Agora é só os possíveis frequentadores verificarem, antes de entrar, quanto a casa mede. Se tiver mais de 1.000 m² e não exibir todas as licenças, o freguês já sabe: não entra, vai correr riscos nas casas com 999 m² ou menos, que não serão fiscalizadas.




Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno "Poder" aos domingos

CÓDIGO ANTI-INCÊNDIO UNIFICADO



País precisa unificar código anti-incêndio, dizem especialistas. Atualmente, cada município tem o seu código próprio, o que atrapalharia o cumprimento das normas

Eduardo Simões - Reuters, 29/01/2013



SÃO PAULO - A fiscalização das condições de segurança de estabelecimentos de todo tipo é precária no Brasil, e o país precisa ter um código de prevenção de incêndio unificado para substituir as diferentes normas vigentes em cada um dos mais de 5 mil municípios brasileiros.

Segundo especialistas ouvidos pela Reuters, a grande variedade de regras de segurança para os estabelecimentos complica o cumprimento dessas normas e encarece os empreendimentos.

No último domingo um incêndio em uma boate em Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul, matou 234 pessoas, a maioria jovens. O fogo começou, segundo a Polícia Civil do Rio Grande do Sul, quando um integrante da banda Gurizada Fandangueira, que tocava no local, acendeu um sinalizador.

Uma faísca do artefato teria iniciado o fogo no revestimento acústico que estava no teto da boate, o que liberou uma fumaça tóxica que asfixiou a maioria das vítimas. Oitenta e oito pessoas ainda estão hospitalizadas em estado grave e, dessas, 83 respiram com ajuda de aparelhos.

"Começa por omissão das autoridades locais", disse à Reuters o especialista em prevenção de incêndios Sérgio Ceccarelli, diretor do Centro de Difusão Científica e Tecnológica em Segurança contra Incêndio (CSI). "Não adianta o comandante do Corpo de Bombeiros vir à TV e dizer 'carregamos 200 corpos'. Não era para ter carregado nenhum."

Na avaliação dele, a boate Kiss, onde aconteceu a tragédia, jamais deveria ter recebido autorização para funcionar. Ele também criticou o fato de casa noturna estar com alvará de funcionamento vencido.

No dia da tragédia, o Corpo de Bombeiros reconheceu que o alvará havia expirado, mas disse que a licença estava em processo de renovação, o que permitiria o funcionamento do estabelecimento. "Ninguém vai pegar um avião se o piloto estiver com a carteira vencida", comparou Ceccarelli.

Alexandre Botelho, diretor da área de consultoria em gestão de riscos da Aon, empresa que atua nas áreas de gestão de riscos e seguros, também apontou falhas na fiscalização no caso de Santa Maria e disse que, em muitos casos, estabelecimentos continuam funcionando apesar de não atenderem a todas as exigências.

"A gente viu muitos profissionais falando que o problema naquele estabelecimento é que tinha superlotação e que foi usado um material pirotécnico. Não foi só isso", disse.

"A saída de emergência era inapropriada para o número de pessoas, só tinha uma, e a questão do material combustível (usado no revestimento acústico) que nem foi mencionada pelos profissionais dos Bombeiros."

Omissão e corrupção
Botelho defendeu a unificação dos códigos de prevenção a incêndios no país. Atualmente, cada município tem o seu código próprio, o que atrapalha o cumprimento das normas.

A precariedade da fiscalização também é apontada como um problema generalizado no país pelos especialistas.

"É omissão das autoridades e é corrupção", disse Ceccarelli, do CIS. "Leis o Brasil tem, mas não são cumpridas", disse o especialista, que aponta a inação das autoridades públicas como responsável pelas 234 mortes de Santa Maria.

PREFEITURA NÃO DEVERIA TER DADO ALVARÁ, DIZ GOVERNADOR

O Estado de S.Paulo 31 de janeiro de 2013 | 12h 05

Prefeitura de Santa Maria não deveria ter dado alvará para boate, diz Tarso Genro. Em entrevista à Rádio Estadão, governador do Rio Grande do Sul afirmou que a tragédia que aconteceu na madrugada do dia 27 poderia ocorrer em qualquer cidade do País
Tiago Silva Dantas


A boate Kiss, em Santa Maria, não deveria ter autorização para funcionar, na opinião do governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT). Em entrevista à Rádio Estadão, na manhã desta quinta-feira, 31, o político disse que a Prefeitura não deveria ter concedido alvará para a casa noturna que pegou fogo no domingo, causando a morte de 235 pessoas.



Ed Ferreira/AE
O governador disse que a Prefeitura deveria ter lacrado a boate em agosto



"Mesmo que (a boate) estivesse dentro de normas legais de engenharia, qualquer leigo olharia aquele local e não daria alvará. Não tinha portas laterais, era uma espécie de alçapão, uma estrutura predatória da vida humana. E era visível que a casa estava preparada para receber mais gente do que o autorizado, cerca de 600 pessoas", afirmou Genro.

O governador disse, ainda, que a Prefeitura deveria ter lacrado a boate em agosto, quando venceu o alvará dado pelo Corpo de Bombeiros. "Mesmo que o documento esteja em análise, a casa deveria estar fechada até o documento sair."

Ainda segundo Genro, a tragédia de Santa Maria ainda pode acontecer em qualquer cidade. "Isso que aconteceu em Santa Maria pode ocorrer em qualquer lugar do País hoje. Basta que as boates estejam lotadas." O governador disse que pediu ao Ministério Público para elaborar uma proposta de unificação das leis de segurança em edificações.

Entenda. O incêndio com mais mortes nos últimos 50 anos no Brasil causou comoção nacional e grande repercussão internacional. Em poucos minutos, mais de 230 pessoas - na maioria jovens - morreram na boate Kiss de Santa Maria - cidade universitária de 261 mil habitantes na região central do Rio Grande do Sul.

A tragédia começou às 2h30 de domingo (27/01), quando um músico acendeu um sinalizador para dar início ao show pirotécnico da banda Gurizada Fandangueira. No momento, cerca de 2 mil pessoas acompanhavam a festa organizada por estudantes do primeiro ano das faculdades de Tecnologia de Alimentos, Agronomia, Medicina Veterinária, Zootecnia, Tecnologia em Agronegócio e Pedagogia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). A maioria das vítimas, porém, não foi atingida pelas chamas - 90% morreram asfixiadas.

Sem porta de emergência nem sinalização, muitas pessoas em pânico e no escuro não conseguiram achar a única saída existente na boate. Com a fumaça, várias morreram perto do banheiro. Na rua estreita, o escoamento do público foi difícil. Bombeiros e voluntários quebraram as paredes externas da boate para aumentar a passagem. Mas, ao tentarem entrar, tiveram de abrir caminho no meio dos corpos para chegar às pessoas que ainda estavam agonizando. Muitos celulares tocavam ao mesmo tempo- eram pais e amigos em busca de informações.

Como o Instituto Médico-Legal não comportava, os corpos foram levados a um ginásio da cidade, onde parentes desesperados passaram o dia fazendo reconhecimento. Lá também foi realizado o velório coletivo.

Ao longo do dia, centenas de manifestações de solidariedade lembraram a tragédia em todo o País. Emocionada, a presidente Dilma Rousseff chorou duas vezes ao falar do caso - ainda no Chile, de manhã, onde deixou um encontro com presidentes, e à tarde, ao lado do governador Tarso Genro, já em Santa Maria.

A RESPONSABILIDADE DA TRAGÉDIA

JORNAL DO COMÉRCIO 31/01/2013


Lino Tavares


Somos um país “mutante” pela própria natureza e isso vem dos primórdios do descobrimento, quando este enorme torrão, hoje chamado Brasil, recebeu nomes de batismo provisórios como Ilha de Vera Cruz e Terra de Santa Cruz. Mudar é bom. Faz parte da evolução humana. Mas é preciso que se mude, sempre ou quase sempre, para melhor, o que não é o caso deste País, onde as mudanças acontecem, via de regra, em relação a coisas menos importantes, conservando-se, quase como uma instituição nacional, aquilo que de pior existe. O setor mais atingido por esse “imobilismo tupiniquim” é o que diz respeito à segurança pública, cujos órgãos de governo incumbidos de garanti-la à população só têm mudado no seu arcabouço burocrático funcional, deixado a desejar - e muito - no aspecto operacional.

Prenda-se quem prender - dono da boate, integrantes da banda que teria provocado o incêndio e até seguranças omissos da casa de espetáculos - nada isentará o Poder Público da irresponsabilidade sobre o funcionamento inadequado daquele “alçapão de portinhola única”, conhecido como boate Kiss, no Centro de Santa Maria. Não vem ao caso discutir se estava ou não com o alvará vencido, pois esse é um dado irrelevante, já que a tragédia se consumou pelo ambiente propício e não pela falta de pagamento de um tributo.

A grande responsável pelo lamentável sinistro (perdão pela redundância, já que todo sinistro é lamentável) é, sem dúvida, a secretaria do governo municipal que concedeu a licença para que um ambiente destinado a abrigar mais de mil pessoas entrasse em funcionamento, desprovido dos requisitos mínimos para utilização desse nível. O resto é consequência. Evidentemente que isso não isenta os que, de forma temerária, usaram essa falha gritante do Poder Público para “acender a ponta do estopim” que detonou essa “bomba de alto poder de destruição” impropriamente chamada de boate.

Jornalista

PENDÊNCIAS E LIMINAR JUDICIAL



JORNAL DO COMÉRCIO 31/01/2013


Cinco estabelecimentos funcionam sem alvará e com liminar judicial


A prefeitura de Porto Alegre divulgou ontem uma lista com a situação de cada casa noturna quanto à regularização municipal. A lista compreende 46 locais regularizados, 24 em processo de regularização, cinco sub judice e um por decisão judicial. As cinco casas noturnas que ainda funcionam sem alvará e com liminar judicial são Cabaret (Cabaret Voltaire), Café Quintino (Café do Prado), Sttutgart, Divina Comédia (Cabo Horn) e Strike 410. O Opinião está aberto devido à decisão judicial. Quatro delas não possuem pendências relativas à segurança do público. O Jornal do Comércio não teve acesso às outras duas.

O Opinião esclareceu por meio de nota que ainda tramita uma sentença de primeiro grau, favorável ao bar, referente a uma obra de expansão dos banheiros da casa, de 1998. “Na época, uma mudança no plano diretor de Porto Alegre foi o motivo do impasse. Hoje não há nenhuma pendência que possa afetar o normal funcionamento da casa”, disse Paulo Finatto Jr., assessor do bar. A prefeitura recorreu da decisão judicial que mantém a casa aberta. “Com todas as normas e exigências da prefeitura e do plano diretor atendidas, o Opinião espera agora que o seu pedido de Habite-se seja concedido”, diz o comunicado.

No caso do Cabaret, a prefeitura interditou o espaço no ano passado sob justificativa de que o local não possuía o Alvará de Prevenção e Proteção contra Incêndios e o Habite-se. A casa noturna ingressou na Justiça em 27 de setembro de 2012, provou que possui a liberação dos bombeiros até 30 de maio deste ano e que vinha se adequando às necessidades legais. Assim, ganhou liminar, no mesmo dia, permitindo funcionar até decisão do mérito.

O Divina Comédia (Cabo Horn) não teve liberado alvará pela prefeitura, segundo o processo que corre na Justiça estadual, devido à ausência de rampas para deficientes. O bar apresentou projeto para a execução e a prefeitura demorou a examinar. Com isso, o proprietário fez a obra de acessibilidade por conta própria e buscou na Justiça autorização para continuar recebendo o público.

A determinação municipal é que uma equipe de técnicos analise as normas de segurança exigidas de bares, boates e casas noturnas por meio de uma força-tarefa. “As casas noturnas de Porto Alegre que possuem alvará atendem às exigências da lei. Porém, se existirem pontos da legislação que podem ser aperfeiçoados, nós vamos fazer isso”, disse o prefeito José Fortunati.
A equipe formada por titulares e técnicos da Procuradoria-Geral do Município, das secretarias municipais da Produção, Indústria e Comércio, do Urbanismo e do Meio Ambiente e o Corpo de Bombeiros terão como objetivo propor as mudanças necessárias para aperfeiçoar a legislação. O grupo iniciou as operações na terça-feira.

Os fiscais estão verificando saídas de emergência e sinalização indicativa e luminosa dessas saídas, obstáculos às saídas de emergência, extintores de incêndio (nível de carga e validade), alteração de projetos dos imóveis e reformas, alarme acústico de emergência e comprovante de treinamento dos funcionários da casa. Segundo a prefeitura, qualquer tipo de material pirotécnico será apreendido, conforme legislação que proíbe o uso desses artefatos em ambientes fechados.

“Nós não queremos inviabilizar qualquer atividade econômica. Mas a segurança das pessoas está em primeiro lugar. Se tivermos que interditar, nós vamos interditar, como já foi feito com estabelecimentos irregulares na cidade”, declarou o prefeito. Os empresários receberão recomendação para afixar na entrada dos estabelecimentos uma placa com a capacidade máxima do ambiente. Fortunati disse também que o público deverá ser informado verbalmente sobre as saídas de emergência e procedimentos de segurança.

O telefone 156 do serviço Fala Porto Alegre está apto a receber informações que possam contribuir para o trabalho das equipes de fiscalização, inclusive denúncias de estabelecimentos irregulares.

ESTÍMULO À OMISSÃO


ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329

PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA


Um episódio que está ocorrendo com o ex-vereador Adeli Sell (PT) ajuda a entender por que muitas vezes os funcionários públicos se omitem na hora de interditar bares, restaurantes e boates. Em 2003, ele era secretário da Indústria e Comércio de Porto Alegre e desencadeou uma campanha intensiva de fiscalização, fechando estabelecimentos com documentação irregular ou que ofereciam risco aos frequentadores. Uma das boates, a Zap, na Rua Dona Laura, no Bairro Rio Branco foi fechada diante da constatação de que o alvará da prefeitura tinha sido falsificado por um funcionário da prefeitura. Naquele endereço, a Smic havia autorizado apenas o funcionamento de uma academia de ginástica.

Os proprietários recorreram à Justiça e o desembargador Luiz Felipe Difini concedeu liminar para que a boate abrisse as portas na noite da inauguração. Indignado, Adeli deu entrevistas dizendo que a decisão manchava a imagem do Judiciário gaúcho. “Daqui a pouco, vão pedir uma Operação Anaconda para investigar o Rio Grande do Sul também”, exaltou-se, referindo-se a uma investigação que envolvia corrupção no Judiciário de São Paulo. As declarações provocaram uma crise entre o Judiciário e a prefeitura. Sentindo-se ofendido, Difini processou a prefeitura por dano moral e ganhou uma indenização de R$ 140 mil. Hoje, a prefeitura move ação regressiva para cobrar de Adeli o ressarcimento do dinheiro que gastou para indenizar o desembargador.

A defesa de Adeli alega que a prefeitura não pode cobrar do ex-secretário se, no processo, sustentou a legalidade da ação dele como gestor público, foco da divergência com o magistrado. Naquele ano, Adeli fechou uma série de estabelecimentos que acabaram sendo reabertos por liminar da Justiça.Um deles, a boate Ice, no bairro Auxiliadora, apresentava, segundo Adeli, semelhanças com a Kiss: era um espaço para mais de 2 mil pessoas, com apenas uma porta de saída. Em outra, ocorria uma festa com o portão fechado a cadeado, aumentando o risco dos frequentadores em caso de incêndio.

Na próxima semana, a defesa de Adeli vai apresentar a contestação. Ainda que a indenização por dano moral tenha sido concedida por conta das declarações do então secretário, consideradas ofensivas, a possibilidade de cobrança futura inibe os fiscais. Entre as seis grandes casas noturnas que funcionam em Porto Alegre amparadas por liminar está o Café Moinhos, no mesmo endereço de uma boate interditada há 10 anos por Adeli, o Café do Prado, na Rua Quintino Bocaiúva, Bairro Moinhos de Vento.


ALIÁS

Quando um juiz autoriza, por liminar, a abertura de um estabelecimento que teve alvará negado pela prefeitura está se responsabilizando por eventuais acidentes no local.


MUDOS PARA SEMPRE

Os telefones celulares enfileirados sobre uma mesa na sede da 1ª Delegacia de Polícia de Santa Maria emudeceram depois de tocar insistentemente na madrugada de domingo. Foi para eles que pais, mães, avós, irmãos e amigos ligaram em busca de notícias quando souberam do incêndio na boate Kiss.

Os chips guardam o registro de ligações não atendidas e de mensagens que os destinatários não chegaram a ler. Foi por um deles que a menina Michele Froelich Cardoso, 20 anos, lançou um apelo desesperado pelo Facebook – “Incêndio na KISS socorro” – antes de ser sufocada pela fumaça tóxica.

Ontem, os celulares, as carteiras de identidade, as bolsas e outros objetos recolhidos junto com os corpos das mais de 230 vítimas ou nos destroços da Kiss começaram a ser entregues às famílias.

Mais segurança

No início da tarde de hoje, o prefeito de Canoas, Jairo Jorge, assina decreto criando um grupo de trabalho que terá 60 dias para apresentar um mapeamento da situação de todos os bares, restaurantes e casas noturnas do município.

Desde 2010, a prefeitura tem um sistema integrado de fiscalização que faz batidas nos estabelecimentos para checar se estão com as licenças em dia, mas o prefeito quer mais.

Depois da tragédia de Santa Maria, Jairo Jorge quer ter certeza de que nenhuma casa está desrespeitando as normas de segurança.


Ação de rotina

Na véspera do incêndio que matou 235 pessoas na boate Kiss, em Santa Maria, uma ação de rotina da Secretaria Municipal de Urbanismo de Caxias do Sul, em conjunto com a Brigada Militar, fechou cinco bares que funcionavam sem alvará.

Outros dois foram notificados porque tinham autorização para operar como bar e restaurante, mas funcionavam como casas noturnas.

Amanhã, o secretário de Urbanismo, Fábio Vanin, vai apresentar ao prefeito Alceu Barbosa Velho um relatório das medidas adotadas para aperfeiçoar o trabalho de fiscalização.




Um dia depois de ter evitado identificar as seis casas noturnas que operam amparadas em liminar da Justiça, o prefeito José Fortunati percebeu que não tinha como adiar a divulgação da informação. Além de liberar os nomes, prometeu dar transparência às ressalvas da fiscalização e ao conteúdo das liminares dos juízes.

Ontem, Fortunati reuniu os secretários envolvidos com licenciamentos para discutir ações que garantam maior segurança.


Missão da Assembleia

Qualquer mudança na legislação sobre prevenção de incêndios precisa passar pela Assembleia Legislativa. É por isso que a tragédia de Santa Maria será tratada pelo presidente que assume hoje, o deputado Pedro Westphalen (PP).

O novo presidente quer começar enfrentando os problemas domésticos: vai proibir o uso de fogos de artifício no interior do prédio, incluindo o Teatro Dante Barone.

Outra promessa é melhorar as condições de segurança do Palácio Farroupilha, por onde circulam 4 mil pessoas por dia. Faltam escadas externas.



Disputa na comissão

A comissão criada na Câmara dos Deputados para acompanhar as investigações da tragédia de Santa Maria corre o risco de se perder na poeira das disputas partidárias.

Como o deputado Paulo Pimenta (PT) foi escolhido para ser o presidente, Nelson Marchezan Jr. (PSDB) pediu para ser o relator. Recebeu a informação de que essa tarefa deverá ficar com uma deputada do Pará.

– Para funcionar, essa não pode ser uma comissão do PT – diz Marchezan, que tem base eleitoral em Santa Maria.

Mesmo sem cargo, ele vai acompanhar a investigação.


Tartaruga

Além da demora na indicação do relator, Nelson Marchezan estranha que a primeira reunião tenha ficado para a semana que vem:

– Deveríamos estar acompanhando as investigações. Marcar a primeira reunião para a semana que vem, às vésperas do Carnaval, é inexplicável.


CONDIÇÃO DE ABERTURA E SUPERLOTAÇÃO

ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329

SANTA MARIA, 27/01/2013

Sem condição legal de abertura

A tramitação do processo de renovação do alvará de prevenção e proteção contra incêndio da boate não deixava a boate Kiss em condições legais de funcionamento, entendem especialistas em direito administrativo e da área de gestão integrada da segurança. A posição contraria os bombeiros, que alegam a inexistência da possibilidade jurídica de interdição do local enquanto se esperava nova vistoria da corporação, mesmo com o documento vencido desde agosto.

Presidente do Instituto Brasileiro de Altos Estudos de Direito Público, o professor de Direito Administrativo da UFRGS e da PUCRS Juarez Freitas diz que a boate teria de encaminhar o documento antes do vencimento:

– A falta de alvará é motivo mais do que suficiente para a suspensão de toda e qualquer atividade naquela casa noturna.

Conforme os bombeiros, a Kiss foi notificada em setembro e apenas em novembro o proprietário solicitou nova inspeção. Eduardo Pazinato, coordenador do núcleo de segurança cidadã da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma), também sustenta que a Kiss deveria estar fechada.

– O município assumiu um risco com o funcionamento da casa – conclui.


Para advogado, Kiss não estava superlotada

Em entrevista coletiva concedida na manhã de ontem, Jader Marques, advogado de Elissandro Spohr, o Kiko, afirmou que o estabelecimento estava “em plenas condições” de receber a festa na noite do incêndio que vitimou mais de 230 pessoas, negou que imagens das câmeras de segurança tivessem sido escondidas e criticou a ação dos bombeiros.

Conforme Jader, uma troca de e-mail supostamente comprovaria a insatisfação dos donos da boate em relação aos fornecedores das câmeras de segurança:

– As câmeras estavam com defeito.

De acordo com o defensor, mesmo com o alvará vencido, a boate estava de acordo com as normas de segurança:

– Todos os equipamentos estivessem em pleno funcionamento.

Durante a coletiva, ele também negou que a casa estivesse lotada:

– É certa a comprovação de que não havia mais de 650 pessoas na casa.

Até ontem, além dos 235 mortos, cerca de 500 pessoas haviam procurado atendimento em hospitais, incluindo os 134 que permanecem internados.



EMPRESA DE BOMBEIROS ASSESSOROU BOATE KISS


ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329

SANTA MARIA, 27/01/2013

Empresa de bombeiros assessorou boate Kiss

ADRIANA IRION E FRANCISCO AMORIM*
Colaboraram Caio Cigana, Juliana Bublitz e Sâmia Frantz

Uma empresa contratada pela boate Kiss – cenário da morte de mais de 230 pessoas na madrugada de domingo – para se adequar às normas de combate a incêndio exigidas pelo Corpo de Bombeiros é ligada à própria corporação. Conforme o site da Secretaria Estadual da Fazenda, a Hidramix Prestação de Serviço é de propriedade de dois bombeiros de Santa Maria e da mulher de um deles.

Denúncias de que bombeiros prestam esse tipo de consultoria e depois aprovam o próprio trabalho – quando é emitido um documento atestando a segurança do estabelecimento – motivou a abertura, há um ano, de um inquérito civil pelo Ministério Público, ainda em tramitação. A atuação de policiais militares em atividade extra deste tipo é vedada pelo estatuto da corporação. Com atuação no ramo de “prevenção de incêndio”, a Hidramix foi aberta em 2005 pelo sargento Roberto Flavio da Silveira e Souza. Em 2008, entrou na sociedade o bombeiro aposentado Jairo Bittencourt da Silva. Em janeiro de 2012, nova alteração: passou a ser sócia da empresa a mulher do sargento Souza, Gilceliane Dias de Freitas.

– Não tem nada de ilegal na minha participação. Faço parte da assessoria da empresa, sou sócio cotista, dou assessoria. Só o que a empresa fez na Kiss foi instalar uma barra antipânico, que pelo que vi foi a única coisa que funcionou no dia (do incêndio). Quem fez o plano de prevenção e combate a incêndio foi uma empresa de engenharia, nós só executamos essa medida do plano, a barra – explicou a ZH o sargento Souza.

Uma das linhas de investigação da Polícia Civil é verificar se a Hidramix participou da elaboração do plano de prevenção e combate a incêndio (PPCI), apesar de seu nome não constar no documento. O bombeiro também confirmou que já respondeu a inquérito policial-militar instaurado pela corporação por conta do trabalho na empresa e que foi absolvido.

– Foi comprovado que só presto assessoria – disse o sargento.


Um serviço ainda dentro da garantia

Segundo Souza, o bombeiro aposentado Jairo saiu da sociedade da Hidramix no ano passado, apesar de seu nome ainda aparecer no site da Sefaz. Souza, que trabalhou na segunda-feira nos escombros do incêndio da Kiss, disse que a empresa presta assessoria a qualquer estabelecimento que a procurar, não só para “casas noturnas”. O sargento também explicou que sua mulher é a sócia majoritária da Hidramix e que ela tem funcionários especializados.

O serviço que a empresa do bombeiro executou na Kiss ainda estava dentro da garantia. Conforme Édio Nabinger, eletrotécnico da empresa, foram feitas visitas de vistoria por conta da garantia em julho e agosto, e a última estava prevista para ocorrer em fevereiro. No site da Secretaria da Fazenda, a Hidramax aparece como empresa que atua nos serviços de limpeza em prédios e domicílios, instalações de sistemas de prevenção contra incêndio e instalação e manutenção elétrica.

Desde domingo, ZH tem pedido à Brigada Militar a divulgação do plano de prevenção a incêndio da Kiss. É com base nas informações do PPCI que os bombeiros emitem o alvará de prevenção e proteção contra incêndio. O alvará da Kiss estava vencido desde agosto, e os bombeiros ainda não tinham vistoriado as condições da casa.


BM promete investigar a conduta de servidor

A Brigada Militar vai investigar a conduta de pelo menos um bombeiro de Santa Maria, proprietário da empresa Hidramix, que fez obras na boate Kiss. No centro da apuração, além do conflito de interesses entre o público e o privado, está a possibilidade de o PM ter se beneficiado de sua condição para aprovação de obras junto ao Corpo de Bombeiros.

Procurado por ZH para falar sobre o fato de bombeiros (o outro sócio que aparece na Sefaz é bombeiro aposentado) terem empresa de prestação de serviços de prevenção de incêndios, o corregedor-geral da Brigada Militar, coronel João Gilberto Fritz, é sucinto:

– Estamos investigando e, se confirmado, é uma infração em que a punição pode chegar à exoneração.

O oficial garantiu que a conduta do bombeiro será apurada no mesmo inquérito policial-militar aberto segunda-feira para investigar a atuação de integrantes da corporação no episódio. Para o oficial, PMs que tenham esse tipo de atividade podem ter desafiado a legislação que rege a atuação de militares.

– Não vou falar do caso concreto, mas o que posso dizer é que um PM não pode ter uma empresa e ainda fazer do batalhão seu QG – afirmou.

Na manhã de ontem, ao ser questionado sobre a suspeita de que o bombeiro Roberto Flavio da Silveira e Souza seria dono de empresa que presta serviço na área de prevenção de fogo, o comandante-geral da BM, coronel Sérgio Roberto de Abreu, disse desconhecer a informação. No mesmo encontro com jornalistas, o tenente-coronel Adriano Krukoski, dos bombeiros da Capital, disse que, se fosse verdade, em princípio, poderia não ser ilegal, mas certamente, “imoral”.

O QUE É O PPCI

- O Plano de Prevenção e Combate a Incêndio (PPCI) é obrigatório para prédios com instalações comerciais, industriais, de diversões públicas e edifícios residenciais. Ao ser aprovado pelo Corpo de Bombeiros, o PPCI embasa a emissão de um alvará que atesta a segurança do local.

- O requerimento para a obtenção do alvará tem de ser acompanhado dos dados do estabelecimento e do proprietário e de informações como tipo de uso e detalhes do imóvel, área total da edificação e área com acesso de público, além de informações específicas de acordo com a finalidade do estabelecimento.

- Com base nas informações, é emitido um certificado em que são descritos os sistemas de prevenção de incêndio e segurança que deverão ser providenciados até a inspeção, como extintores de incêndio e sistemas de iluminação de emergência.

- Os bombeiros fazem a inspeção. Se o local estiver em conformidade, é emitido o alvará. Caso contrário, correções são pedidas e uma nova vistoria é feita em 30 dias.


CONJUNTO DE OMISSÕES

ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329

EDITORIAIS


Estão reunidas as principais evidências de que a tragédia de Santa Maria resultou de um conjunto de negligências. Também é inquestionável que as omissões e transgressões constatadas até aqui caracterizam crimes graves. Resta apenas, a partir das investigações, tipificar os delitos cometidos e apontar seus responsáveis, para que o inquérito seja encaminhado à Justiça e se faça a reparação possível. Até lá, tudo o que não deveria ocorrer já está acontecendo, que é o jogo de empurra entre autoridades municipais e estaduais e a tentativa de politização do caso.

É evidente que os proprietários da boate, os artistas, a prefeitura e os bombeiros terão de se submeter a avaliações da polícia e do Ministério Público, com a decisiva colaboração da imprensa. Negar-se a admitir falhas, tentar transferi-las a outras instituições ou adotar atitudes diversionistas, como vem ocorrendo desde o início das investigações, são posturas que apenas tumultuam as sindicâncias. É óbvio que os proprietários da boate devem ser os primeiros a responder por seus atos. A responsabilidade empresarial, por princípio, independe de ações fiscalizadoras. Qualquer atividade deve se submeter às leis e normas civilizatórias que regulam negócios, relações humanas e todas as formas de convivência coletiva.

A origem da tragédia está, portanto, na conduta inescrupulosa dos que pensaram em obter lucros a qualquer custo. Já está provado que a boate tinha um teto com revestimento de espuma instalado à revelia das normas de segurança e depois da última vistoria pelos bombeiros e que nem mesmo os extintores funcionavam – fora outras sérias deficiências de segurança. Se essas falhas combinadas criaram o ambiente que provocou a tragédia, os órgãos responsáveis pela fiscalização falharam em suas atribuições. É aqui que o setor público aparece, não como investigador, mas agora como investigado. A prefeitura de Santa Maria e os bombeiros, os principais envolvidos nas suspeitas de omissão, não podem, sob o argumento de que defendem os pontos de vista corretos, retardar ou fornecer informações pela metade e tentar ocultar documentos.

Nesse contexto, Ministério Público, imprensa e cidadãos têm que continuar pressionando para que os relapsos e gananciosos sejam responsabilizados e também para que o natural sentimento de revolta da população não derive para linchamentos e injustiças. Uma investigação rigorosa e transparente é o único caminho para evitar mal-entendidos e, na sequência dos desdobramentos da tragédia, contribuir para que se esclareçam outros casos. É no mínimo inusitada, por exemplo, a situação de seis casas noturnas de Porto Alegre que, segundo a prefeitura, funcionam com liminar da Justiça, depois de terem sido interditadas pela fiscalização. A situação das boates deve ser reavaliada, e com urgência, para que nenhuma instituição corra o risco de ser avalista de imprudências como as que levaram à tragédia de domingo.

FISCALIZAR É PRECISO

ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329. ARTIGOS

Valter Nagelstein*


O momento é de profundo pesar, as circunstâncias são terríveis e a dor da tragédia parece crescer a cada dia, conforme a ficha vai caindo. Agora se discutem causas e responsáveis, mas nada aplaca a dor nem resgata as vidas. Fiscalizar não é tarefa fácil, ao contrário, é missão espinhosa e muito difícil. Difícil porque é tarefa atrelada à opinião pública de grandes parcelas da sociedade que hoje em dia (e por mídias sociais) rapidamente se organizam, com o poder de causar “estragos” em quem ousar enfrentá-las. Em Porto Alegre, por exemplo, jovens, artistas, empresários e algumas lideranças políticas se organizaram rapidamente quando a fiscalização apertou. Alguns ingenuamente, outros irresponsavelmente pensaram só nos seus interesses. É nesse momento que a maioria dos agentes públicos vacila, cai na tentação fácil de não criar atritos, não ferir interesses, não se desgastar, deixando as coisas como estão. A omissão é a porta de escape que não existiu na Kiss.

Agora surgem também discussões sobre a legislação. Creio que é suficiente o que há e não vejo espaço, me perdoem, para oportunismos legislativos. Há que se cumprir, isto sim, e com rigor, o que já existe. Não se deve aceitar senões, senão o de cumprir a lei e assim entender que quem pode atender aos requisitos investe e trabalha, e quem não pode, que busque outra atividade. Projetos, uma vez assinados por arquiteto e/ou engenheiro, sabem pensar a necessidade de evacuar um local rapidamente, as normas técnicas, bem como os melhores materiais para evitar tragédias. O que precisamos em todo o Brasil é fazer entender que exigir segurança não é ser contra a noite, contra os músicos, contra a alegria, contra empresários, é, sobretudo, ser a favor da vida. É principalmente saber discernir onde está o lado certo das coisas.

Foi com este objetivo que durante a minha gestão na Secretaria Municipal da Produção, Indústria e Comércio (Smic) – abril de 2010 a abril de 2012 – foi implementada uma série de ações fiscalizatórias nas casas noturnas, bares e restaurantes da Capital. Nesse período, foram realizadas 6.648 ações fiscais, 237 notificações a casas noturnas e 41 interdições. Dessas, nasceram a revolta de muitos, as passeatas, os lobbies, as campanhas nas redes sociais, e o dolorido silêncio dos bons.

Nestes instantes de dor – e só nestes infelizmente – é que se lembra que é tarefa da autoridade zelar pela saúde e segurança da população e fazer isso não é “autoritarismo”. Mas a solidão da decisão política amedronta a muitos.

Assim espero – e até em memória das vítimas – que lições fiquem: ao político, a de não vacilar, bem como valorizar os fiscais que cuidam das cidades, treiná-los, criar ferramentas de controle anticorrupção, remunerá-los bem e dar-lhes meios materiais. À sociedade, o apoio que deve dar e a consciência que deve ter de que a sua omissão está acumpliciada à tragédia. Fiscalizar é preciso, ser simpático não é preciso.

*VEREADOR DE PORTO ALEGRE (PMDB)

FERIDOS NA AVALANCHE DO GRÊMIO

ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329

GRÊMIO

Feridos na avalanche



Dezenas de torcedores do Grêmio que comemoravam o gol marcado por Elano contra a LDU, aos 16 minutos do segundo tempo, na Arena, pela primeira fase da Libertadores, caíram no fosso depois que a pressão causada pela avalanche rompeu a grade de proteção. Os torcedores despencaram da arquibancada no momento em que cedeu a estrutura colocada sobre a mureta, justamente para evitar a pressão causada pela avalanche.

O serviço médico de emergência do estádio rapidamente se dirigiu ao local, sendo reforçado por integrantes da Brigada Militar. Pelo menos oito pessoas teriam ficado feridas. Duas jovens foram levadas pela ambulância para atendimento no Hospital de Pronto Socorro, nenhuma delas em estado grave. Uma era a assistente comercial Camila Spiazzi, 24 anos.

– Não vi o que aconteceu. Quando percebi, já estava no chão – afirmou a comerciária, após ser atendida no HPS, na madrugada desta quinta.

A moradora de Esteio teve ferimentos no cotovelo e precisou levar três pontos na cabeça. Ela estava acompanhada da amiga Lílian Vieira, que ficou com o braço preso a um gradil, mas não precisou de atendimentos.

O presidente da Grêmio Empreendimentos, Eduardo Antonini, disse que o incidente lhe surpreendeu:

– Nos preocupa e temos de corrigir. Temos de ter um lugar 100% seguro.

Questionado sobre extinguir a avalanche, Antonini preferiu esperar por um estudo mais detalhado.

– Vamos tomar todas as medidas para que o torcedor tenha segurança. Estamos falando de vidas, não podemos tomar decisão baseado em algo passional – disse Antonini.

A avalanche é uma polêmica constante na Arena. Antes mesmo da inauguração, a BM alertava sobre a falta de segurança do único setor do novo estádio que não dispõe de cadeiras. Oficiais chegaram a pedir a proibição da comemoração, marca tradicional das organizadas tricolores.



Investigação


O coronel Alfeu Freitas, comandante de policiamento na Capital, afirmou que uma investigação definirá os responsáveis pelo incidente da noite de ontem:

– Vamos conduzir uma investigação e alguém terá de ser responsabilizado por isso. A polícia fará a perícia no local e determinará as causas desse problema. A apuração dos fatos vai ser conduzida pela Polícia Civil, e, paralelamente, o Corpo de Bombeiros fará uma investigação para avaliar a parte de estrutura e engenharia.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É MAIS UM EXEMPLO DE DESCASO E IRRESPONSABILIDADE NAS QUESTÕES DE SEGURANÇA E DEFESA CIVIL. O Comandante do CPC e os oficiais bombeiros receberam críticas contundentes e afrontosas quando tentaram impedir a avalanche do Grêmio na Arena. Todos aqueles que fizeram estas críticas e que defenderam as justificativas falaciosas e criminosas deveriam ser responsabilizados pelo ocorrido de ontem. As autoridades precisam ser fortalecidas pelas leis, pela justiça e pelo conhecimento técnico que possuem. Chega de apadrinhar erros e intervenções indevidas em questões técnicas, pois vidas humanas estão sendo perdidas.

FOTO DRAMÁTICA

ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329

SANTA MARIA, 27/01/2013

Uma imagem, quatro dramas

LETÍCIA COSTA, MARCELO MARTINS E NILSON MARIANO

A tragédia que enlutou os gaúchos e comoveu o mundo produziu uma cena que uniu os destinos de quatro homens, na madrugada de domingo, em Santa Maria. Em meio à fumaça venenosa que tomava a Rua dos Andradas, o personal trainer Ezequiel Corte Real carregou o universitário Bruno Kräulich nos braços, correndo lomba acima (a imagem foi publicada por ZH na segunda-feira, reprodução ao lado). Na tentativa de salvamento, foi auxiliado pelos soldados Thiago dos Santos Flores e Luciano Antunes. Tanta coragem foi em vão: Bruno morreu.

Preste atenção à cena que irrompe no meio da fotografia ao lado, num dos testemunhos estremecedores da tragédia que causou pelo menos 235 mortes em Santa Maria, na madrugada de domingo.

É Ezequiel Corte Real, 23 anos, que corre lomba acima, escapando do fumo pestilento e das labaredas que consomem a boate Kiss. Rosto contraído pelo esforço, músculos das pernas retesados, transporta nos braços o universitário Bruno Kräulich, 28 anos, já desfalecido.

A imagem foi capturada pelo fotógrafo Germano Rorato, do Diário de Santa Maria (DSM), um pouco antes das 4h, durante a cobertura do incêndio. A foto circulou pelo mundo, estampou a primeira página do The New York Times, o mais influente jornal do planeta. Expôs o desespero dos que tentavam salvar, a agonia dos feridos por sobreviver.

O santa-mariense Ezequiel estava ali por acaso. Não pretendia entrar na Kiss, as pernas lhe doíam em função dos repetidos exercícios que fizera no sábado como personal trainer. Não tinha disposição para dançar. Acabara de jantar com amigos num restaurante que oferece uma mescla de churrasco e pizza. Depois de saborear carnes e saladas, rumou para a boate apenas para encontrar a galera. Queria conversar um pouco, iria para casa dormir.

Mas Ezequiel acabou ingressando no alçapão convertido em braseiro – pouco depois da meia-noite de sábado, não lembra exatamente o horário. Foi então que seu destino se cruzou ao de Bruno Kräulich, que também não costumava se demorar e havia prometido assar o churrasco de domingo para a mãe, a irmã e a sobrinha, com quem morava.

– Ele era como um pai para a minha filha de sete anos – contaria Leyla, 32 anos, irmã de Bruno, na terça-feira.

Quando surgiu o fogo que se alastrou pelas paredes de espuma da boate, e a fumaça tóxica começou a matar por sufocamento, Ezequiel tratou de escapulir. Misturado ao turbilhão de jovens embretados no corredor da saída, sem enxergar na escuridão, deu-se conta de que, no afã de safar-se, derrubara duas moças. Mortificou-se, pensou em recuar, mas também era impelido pelo efeito dominó dos corpos em desequilíbrio.

Sem camisa – improvisou-a como máscara –, Ezequiel voltou atrás das duas mulheres que tombaram no movimento de boiada. Passou a recolher corpos estirados, puxando-os pelas pernas ou pelos braços, até o meio da rua, onde ficariam livres das emanações da combustão. Foram um, dois, três, 10, 15 corpos...

– Não via rostos, nada. Acho que arrastei umas 30 pessoas para fora da boate – narraria ele mais tarde.

Movido pela adrenalina e pelo pavor, esquecera o desconforto nas pernas. Ao encontrar um rapaz desacordado – o único que não lhe erguera as mãos –, concluiu que não bastaria depositá-lo na rua. Era Bruno, mestrando de Agronomia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

Com 1m80cm de altura e 92 quilos, o personal trainer ergueu Bruno – até então um estranho – pelos braços e iniciou a corrida rumo à ambulância mais próxima. Intuiu que carregava quase cem quilos – a sensação de peso agravada pela posição inerte do corpo da vítima.

– Ele não dava sinal nenhum. Estava mole, mole – lembraria Ezequiel.

Foram 40, 50 metros de subida pelo asfalto ardente da Rua dos Andradas, sem parada de descanso. O personal não olhou para o rosto de Bruno. Não olhou para nenhum dos rostos que socorreu. Só ouvia outras pessoas gritando, ao seu redor, para desobstruir a pista:

– Sai da frente, sai da frente!

Ao se aproximar da ambulância, ela partiu acelerada, lotada de feridos. Então, Ezequiel acomodou Bruno numa viatura da Brigada Militar e retornou para a maratona de salvamentos.

– Não sei quem era. Não faço ideia do que aconteceu com ele depois – disse.

Bruno morreu. No velório, realizado em Tuparendi (Região Noroeste), Leyla soube por amigos que o irmão teria retirado duas pessoas de dentro da boate, antes de perder a consciência. Ela acreditou, era próprio de Bruno – descrito como quieto e prestativo – amparar os outros.

Leyla ignorava que Bruno estava na boate Kiss. Ele havia comentado apenas que ia sair e dispunha de mais de uma alternativa para se divertir. Deve ter se decidido com os colegas perto da meia-noite. Na tarde de sábado, ao tomar chimarrão na companhia da mãe e da irmã, combinara o churrasco dominical. Com a morte do pai em um acidente de trânsito, em 2007, desvelou-se ainda mais pela família.

Ele se transferiu para Santa Maria após ter concluído o Ensino Médio, em Tuparendi. Fez cursinho pré-vestibular, morou em pensão de estudantes. Para manter a família unida, pais e irmã foram depois. Apaixonado pela agricultura, trabalhou em lavouras dos Estados Unidos e também fazia pesquisas sobre soja.

Ao deixar Bruno na viatura de socorro, Ezequiel retornou para buscar mais vítimas. Só deparou com a face da morte quando arrombaram as paredes da Kiss. O facho da lanterna, cedida por um policial, iluminou um rosto convulsionado pelos esgares do pânico, de alguém que não achou a saída para a rua.

Ezequiel parou quando seus braços adormecidos não tinham mais a quem carregar. Visitou um amigo no hospital, depois foi para casa. Antes de ser nocauteado pela exaustão, desculpou-se no Facebook por não ter conseguido resgatar mais vítimas da boate Kiss.

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Agora repare nos outros protagonistas que compõem a imagem na Rua dos Andradas. Ao pressentir que Ezequiel se cansaria na corrida para salvar Bruno, o soldado Thiago dos Santos Flores, 27 anos, disparou na frente para abrir alas. Para encurtar o caminho de Ezequiel, gritava para o motorista da Patrulha Tático Móvel (Patamo) dar marcha à ré.

– Altamir, traz a viatura! A viatura! – pedia Thiago, a sola dura da botina percutindo no asfalto.

Altamir manobrou rápido. Acomodou o corpo de Bruno e rumou para o hospital. Não havia tempo de esperar o regresso de uma ambulância. Motoristas particulares e taxistas também apareceram para auxiliar no transporte das vítimas.

Houve um momento em que o soldado Thiago asfixiou-se com os rolos de fumo expelidos da boate. Na urgência de socorrer, esqueceu-se de colocar a máscara antigás. Afastou-se da Kiss, tentou aspirar um pouco de ar fresco, depois voltou à tarefa.

– Só queria ajudar, ajudar e ajudar – recordaria depois.

Thiago penou para dormir na noite seguinte – os corpos semidesnudos de jovens mortos assaltaram-lhe o sono. Evangélico, conseguiu se acalmar depois de ir à igreja rezar.

– Foi um trauma muito forte – comentou.

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No instante em que o soldado Thiago corria à frente de Ezequiel, o PM Luciano Antunes, do 2º Batalhão de Operações Especiais (BOE), estava ao lado do carro de bombeiros. Caminhava em sentido contrário, em direção à viatura, para conduzir mais vítimas no banco traseiro da Blazer.

– Só cabia dois ou três. Alguns já estavam desmaiados – relataria Antunes, 35 anos.

O PM fazia a patrulha noturna, com mais três colegas do BOE, quando ouviu o alerta de incêndio pelo rádio. Abalaram-se para a boate Kiss, sirene aberta, na intenção de organizar o trânsito. Logo, mãos de tenazes, de pais e amigos das vítimas, se agarraram ao colete de Antunes.

– Tira o meu amigo de lá – implorava uma jovem.

– A minha irmã tá lá dentro – berrava, desesperado, outro familiar.

Antunes desdobrou-se, mas se viu impotente. Não sabia se os jovens que arrastava para a viatura ainda viviam.

– Foi o inferno – descreveria na segunda-feira.



FISCALIZAÇÃO AUMENTA

ZERO HORA 30/01/2013 | 20h47

Ministério Público lança ofensiva para reforçar fiscalização de casas noturnas. Recomendação foi encaminhada a promotores de todas as comarcas para que verifiquem atuação de prefeituras e do Corpo de Bombeiros

Marcelo Gonzatto




O Ministério Público Estadual lançou nesta quarta-feira uma ofensiva para reforçar a fiscalização de casas noturnas em todo o Estado

Uma recomendação foi encaminhada a promotores de todas as comarcas para que verifiquem a atuação de prefeituras e do Corpo de Bombeiros e, em caso de comprovação de falhas na verificação das regras, adotem medidas como fiscalizações realizadas pelo próprio MP e a responsabilização administrativa, civil e penal das autoridades omissas.

A recomendação assinada pelo procurador-geral de Justiça do Estado, Eduardo de Lima Veiga, procura reduzir o risco de que boates e estabelecimentos semelhantes funcionem sem as condições necessárias de segurança após o desastre ocorrido em Santa Maria.

— Em último caso, poderemos até realizar vistorias por iniciativa própria e interditar estabelecimentos em situação irregular — avisou o procurador-geral.

Eduardo de Lima Veiga ressaltou, porém, que o MP vai procurar agir em parceria com os municípios e o Corpo de Bombeiros. Somente quando forem identificados casos de omissão serão tomadas medidas mais duras. O artigo 2º do documento enviado às comarcas estabelece que "na hipótese de ser constatada a omissão da fiscalização e exercício do poder de polícia pelos órgãos Estaduais e Municipais, os Membros do Ministério Público deverão adotar as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis, inclusive interdição, se for o caso, sem prejuízo da apuração da responsabilidade dos proprietários, responsáveis, administradores a qualquer título e dos agentes públicos."

— Isso pode incluir processos por improbidade, no âmbito civil, além de outros nos níveis penal e administrativo — explicou o procurador-geral.

O foco da ofensiva deverá ser estabelecimentos com planos de combate a incêndio e alvarás prestes a vencer, já vencidos, ou casas noturnas que tenham denúncias de irregularidades. Além disso, o MP gaúcho também remeteu um anteprojeto de lei à Casa Civil com sugestões de mudanças na legislação que regula esse tipo de estabelecimento. O subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Jurídicos, Ivory Coelho Neto, ressaltou que a intenção da proposta é inverter a lógica que predomina atualmente na legislação.

— A casa ou estabelecimento tem que provar que pode funcionar — declarou.

Neto também defendeu a extinção dos chamados “alvarás provisórios” e o treinamento de bombeiros civis para locais com grandes aglomerações. Em Santa Maria, o promotor de Justiça aposentado Adede Y Castro foi convidado a elaborar o texto de um abaixo-assinado pedindo uma fiscalização mais eficiente por parte das autoridades e o cumprimento da legislação de segurança. Os organizadores da iniciativa deverão disponibilizá-lo em papel e nas redes sociais.

— Esse é o momento de cobrar atitudes, não podemos só ficar chorando — declarou o promotor aposentado e escritor.


MOTIVADA PELA TRAGÉDIA

Prefeitura da Capital interdita casa noturna na Avenida Independência. Forro inflamável e pé direito muito baixo estão entre itens que motivaram fechamento na noite desta quarta-feira


Prefeitura fez força-tarefa para avaliar as condições de boates em Porto Alegre
Foto: Jean Schwarz / Agencia RBS


Na segunda noite de fiscalização em casas noturnas da Capital, uma boate foi fechada e outra foi parcialmente interditada. Na ação, realizada pela prefeitura e bombeiros nesta quarta-feira, foram apontadas situações de risco no Cabaret, como forro de material inflamável, pé direito muito baixo e difícil acesso a uma porta de saída nos fundos do estabelecimento, segundo descreveu secretário municipal da Produção, Indústria e Comércio, Humberto Goulart. O lugar foi lacrado.

O dono do estabelecimento, Jeremy Crawshaw, ressaltou que a administração do local não é omissa em relação à segurança e que, durante a fiscalização, a avaliação dos bombeiros foi de que o local deveria ser apenas notificado, enquanto a Secretaria Municipal de Produção, Indústria e Comércio determinou a interdição. Ele também refutou a alegação de que o forro é inflamável e informou que irá apresentar aos bombeiros, nesta quinta-feira, a documentação que comprova isso.

Também localizada na Avenida Independência, o Beco foi parcialmente interditado. A fiscalização proibiu a realização de eventos no primeiro piso do estabelecimento. Foram constatadas falhas em luzes de emergência, e a escada de acesso a uma das saídas de emergência foi considerada muito estreita. Os responsáveis pelo lugar se comprometeram a participar de uma reunião com bombeiros nesta quinta-feira a fim de encaminhar a regularização.

A fiscalização passou também pelo Opinião, onde não encontrou problemas que exigissem interdição.

A força-tarefa para avaliar as condições de boates em Porto Alegre começou na terça-feira, motivada pelo incêndio que causou mais de 230 mortes na Kiss, em Santa Maria.

"PUNA-SE. SEJA QUEM FOR", DIZ PREFEITO

ZERO HORA 31/01/2013 | 06h04

"Puna-se. Seja quem for", diz prefeito de Santa Maria. Cezar Schirmer conversou com Zero Hora sobre a tragédia na boate Kiss


Schirmer diz que está passando por momentos horríveis
Foto: Germano Rorato / Especial


Juliana Bublitz e Leandro Belles


Por cerca de duas horas, o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB), recebeu os repórteres Juliana Bublitz e Leandro Belles para falar sobre a tragédia que que horrorizou o Rio Grande do Sul. Visivelmente abalado pelo ocorrido, ele chorou durante a conversa e se disse seguro em relação ao tratamento dado pela prefeitura ao caso. Sem querer apontar culpados, Schirmer apresentou uma série de documentos que apontaria para o Corpo de Bombeiros, a responsabilidade sobre as irregularidades encontradas na boate Kiss.

Zero Hora — O senhor está passando por um momento difícil. Como está lidando com isso?

Cezar Schirmer — A minha dor, é a dor do cidadão, do pai, do prefeito. Por que Santa Maria? É só aqui que tem boate com problema?

ZH — Como estão sendo seus dias?

Schirmer — Horríveis. Estou sem comer, não estou conseguindo dormir... (Schirmer faz uma longa pausa, baixa a cabeça, suspira e chora). Eu nunca chorei na minha vida. Tem um filho de um primo, quatro filhos de funcionários da prefeitura, que perderam a vida na tragédia. Não há ninguém que não tenha sofrido com isso.

ZH — A que o senhor atribui a tragédia? Não é uma fatalidade.

Schirmer — São uma soma de circunstâncias. Formalmente, esta questão tem de ser concluída pelo inquérito policial. Mas algumas coisas estão um pouco claras. Este sinalizador, talvez este equipamento que dizem que não funcionou (o extintor), a dificuldade na hora da saída.

ZH — Circunstâncias que poderiam ser evitadas?

Schirmer — Não sei te dizer. Não me atrevo a opinar.

ZH — Qual é a responsabilidade da prefeitura neste caso?

Schirmer — A prefeitura não tem nenhuma responsabilidade. Do ponto de vista formal. Outros procedimentos que envolvem o cumprimento da legislação, no que diz respeito à prefeitura, foram cumpridos. Isso nos traz de volta os mortos? Claro que não. Estamos vivendo uma tragédia. Nós queremos que se aprofundem as investigações. Claro que não quero, não é meu papel, atribuir a este ou àquele, se eventualmente aparecer durante as investigações. Se este ou aquele agiu inadequadamente, puna-se. Seja quem for.

ZH — O fato de o alvará de prevenção de combate ao incêndio estar vencido, desde agosto de 2012, não levaria a prefeitura a interditar o local?

Schirmer — Não. Isso não chega ao conhecimento da prefeitura, em tese. Tanto que, quando a prefeitura fez a vistoria, a gente colocou lá que o alvará venceria em breve. Isso foi uma vistoria que a prefeitura tem obrigação de fazer. Se no ano seguinte, a prefeitura voltasse lá e continuasse irregular, aí sim tem de tomar providência. Agora, se tivesse recebido uma denúncia sobre qualquer irregularidade, iria até lá.

ZH — A prefeitura fez vistoria em abril de 2012. Mas esta vistoria não atenta para estas questões: havia apenas uma saída, as janelas estavam lacradas. O fiscal que vai lá não olha para esses detalhes?

Schirmer — Quando tu dás o primeiro alvará, o grau de detalhamento é um. Depois, é para ver se não houve modificação disso ou aquilo. Se a estrutura originalmente aprovada se mantém.

ZH — Por que houve modificação na boate. Eles rebaixaram o teto. Eles colocaram aquela espuma no teto. Esta vistoria não verificou essas modificações? Foi depois da vistoria que eles mudaram?

Schirmer — Te confesso que não sei.

ZH — Então, o seu fiscal foi lá e fez um apontamento que o alvará de combate a incêndio venceria em tal data. A partir disso, vocês não fizeram uma acompanhamento para ver se isso foi regularizado?

Schirmer — Não, por que a vistoria da prefeitura é anual.

ZH — É o Corpo de Bombeiros que tem de fazer?

Schirmer — Quem tem de avaliar, investigar não é a prefeitura.

ZH — Os bombeiros dizem que não é responsabilidade deles analisar a espuma usada no teto. De quem é a responsabilidade?

Schirmer — Eu não vou te responder. Examine as leis e façam juízo.

ZH — Por que o senhor não quer dizer?

Schirmer — Porque não me cabe. Me cabe sim responder por questões que envolvem a prefeitura. O que envolvem outras responsabilidades é o inquérito que tem de tratar.

ZH — O senhor foi criticado, na mídia e nas redes sociais, por ter se calado por alguns dias. Por que o senhor não falou antes? Não revelou estes documento antes?

Schirmer — A tragédia tem proporção de catástrofe. Desde o primeiro momento, nos focamos em três tarefas: socorro aos sobreviventes, amparo às famílias e da logística, da estruturação de procedimentos que o fato exigiu. Então, a questão relevante era o pós-tragédia. Agora, em nenhum momento eu me neguei a falar. Só não falei sobre isso porque não tinha informações sobre estes documentos e nem sobre a legislação.

ZH — Então, o senhor não sabia que o alvará dos bombeiros estava vencido?

Schirmer — Obviamente que não. Não passa por mim o licenciamento de qualquer prédio. A prefeitura tem uma estrutura formal para isso.

ZH — Houve alguma falha na estrutura?

Schirmer — Quem pode detectar isso é o inquérito. Olhando os documentos, eu não identifiquei nada que possa se constituir em uma conduta equivocada.

ZH — O governador Tarso Genro disse que se havia algum problema em alguns dos itens para que o alvará fosse emitido era responsabilidade da prefeitura.

Schirmer — Eu não vi esta declaração do governador e não concordo com ela, se foi feita.

ZH — Daqui pra frente pode haver mudanças nos procedimentos da prefeitura?

Schirmer — Seria bom ter uma legislação nacional que estabelecesse requisitos mínimos para estes tipos de estabelecimentos.

ZH — E a fiscalização vai ser intensificada?

Schirmer — Nós decidimos ontem, se for este desejo da população, transformar o local em um monumento à juventude, à memória e à vida. Nós não vamos esquecer disso. Também decidi fechar por 30 dias todas as casas de espetáculo. Determinei uma vistoria em todas elas. Obviamente, antecipar, depois deste período, todas as vistorias.

ZH — O senhor tem medo que este episódio marque a sua carreira?

Schirmer — Este episódio já marcou a minha vida. Eu acho que o mais importante que a minha carreira é a minha vida. Marcou a vida de todos os moradores da cidade. Certamente nada mais será como foi.

ZH — O senhor acha que errou em algum momento?

Schirmer — Pessoalmente não me sinto responsável por qualquer questão. Agora, isso não invalida a minha dor. A dor de todas as famílias.

ZH — Em Buenos Aires, em caso semelhante, o prefeito chegou a deixar o cargo. O senhor teme o mesmo?

Schirmer — Se houver qualquer exploração política desta tragédia, a população será sábia em perceber o que está acontecendo. Da minha parte, eu vou deplorar.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

EMPRESA DE BOMBEIRO ATUALIZOU PLANO DE SEGURANÇA

ZERO HORA ONLINE 30/01/2013 | 18h07

Empresa de bombeiro atualizou plano de segurança da Boate Kiss. A empresa Hidramix, de Santa Maria e que atua no ramo de "sistemas de prevenção de incêndio", atualizou o planejamento de medidas de combate a incêndio


Foto: Divulgação / Polícia Civil

Adriana Irion e Francisco Amorim*


A empresa que atualizou o planejamento de combate a incêndio da boate Kiss é de propriedade de bombeiro lotado em Santa Maria.

Os policiais militares Jairo Bittencourt da Silva e Roberto Flavio da Silveira e Souza - que é bombeiro - são donos da Hidramix Prestação de Serviço, que atua no ramo de "sistemas de prevenção de incêndio". A mulher de Souza, Gilceliane Dias de Freitas, também compõe o quadro societário do estabelecimento.

Em 2012, a Hidramix foi chamada pela Kiss para fazer o orçamento de medidas de combate a incêndio que estariam desatualizadas. Foram estudadas três medidas, mas segundo Édio Nabinger, eletrotécnico da Hidramix, a empresa somente executou uma parte das alterações necessárias para a liberação pelos Bombeiros.

Ainda segundo Nabinger, a Hidramix esteve na Kiss mais duas vezes, em julho e agosto, por conta da garantia dada pelo serviço. A próxima visita estava marcada para o final de fevereiro.

Na página do Facebook de Gilceliane há fotos de família em que ela está com o marido, o bombeiro Roberto Souza. Em algumas das imagens, inclusive, Souza usa uma camiseta com o nome da Hidramix.

Conforme o site da Sefaz, a empresa foi aberta em 2005, quando Souza aparece como sócio. Gilceliane só ingressou na sociedade em 24 de janeiro de 2012. O site da Sefaz informa que a empresa atua nos serviços de limpeza em prédios e domicílios, instalações de sistemas de prevenção contra incêndio e instalação e manutenção elétrica.


No final da manhã, o comandante-geral da BM, coronel Sérgio Roberto de Abreu, foi questionado por ZH sobre o fato de bombeiro ter esse tipo de empresa e disse desconhecer a informação.

* Colaborou Juliana Bublitz

NÃO VAMOS PEGAR SÓ OS PEQUENOS, DIZ DELEGADO DA PC

'Não vamos pegar só os pequenos', diz delegado. Policial afirma que investigação agora vai focar na responsabilidade do poder público


Diego Zanchetta - O Estado de S.Paulo , 30/01/2013





O delegado regional da Polícia Civil Marcelo Arygone afirmou nessa terça-feira, 29, que "não serão apenas os pequenos os presos" pela tragédia que deixou 235 mortos na boate Kiss, em Santa Maria, no interior gaúcho. "Tem muita gente dizendo aí em redes sociais que nós só prendemos os pequenos até agora. Isso não é verdade. A ordem é cortar a carne do próprio Estado. Gostaria de dizer para o povo ficar em paz porque ninguém vai escapar de ser responsabilizado, independente da instituição que seja", prometeu o delegado.

"De agora em diante, o objetivo da investigação será evidenciar as falhas administrativas do caso", resumiu o delegado regional de Santa Maria. "Os indicadores são fortes e apontam para uma responsabilização de agentes públicos", disse Arygone.

O responsável pela investigação foi taxativo ao afirmar que a casa noturna não poderia estar aberta. "Fica cada vez mais claro que houve falhas graves na fiscalização." Além dos alvarás vencidos, ele afirma que nem o governo municipal nem o Corpo de Bombeiros explicaram quatro evidentes falhas na boate e que deveriam ter sido alvos de notificação do poder público: a falta de uma nova saída que seria necessária após a ampliação da boate, em janeiro de 2012; a superlotação constante todos os fins de semana, segundo depoimentos; o uso de espuma inflável como isolante acústico, o que é vetado por lei municipal; e a realização de shows pirotécnicos com sinalizadores. Esse último fator (que precisaria de autorização especial) era comum nas festas do estabelecimento, conforme relataram à polícia jovens que se salvaram da tragédia.

Inquérito. A polícia também quer saber por que a prefeitura não fiscalizou a boate após o Ministério Público Estadual abrir um inquérito civil, em novembro de 2012, para apurar barulho nas madrugadas de domingo na boate - a denúncia foi feita por vizinhos. Logo após abrir o inquérito, o promotor Cesar Augusto Carlan enviou um ofício à prefeitura cobrando providências. Carlan e a polícia querem saber agora se houve alguma vistoria no imóvel após esse ofício.

A polícia também estuda pedir a prorrogação da prisão temporária dos dois donos da boate e de dois integrantes da banda. Investigadores fizeram busca e apreensão em mais dois estabelecimentos noturnos de Mauro Londeiro Hoffmann, um dos sócios da boate Kiss, localizados em Santa Maria. A boate Absinto e a choperia Floriano também tinham uma única porta para entrada e saída. Ambas as casas estão fechadas desde domingo.

PROMOTORES APURAM IMPROBIDADE DE AGENTES DA PREFEITURA E DOS BOMBEIROS

O ESTADÃO, 29/01/2013

Promotores apuram improbidade de agentes da prefeitura e dos bombeiros. Boate Kiss estava sem licença municipal de funcionamento desde 31 de março e sem alvará de prevenção de incêndio desde 14 de agosto

Diego Zanchetta, Enviado especial


SANTA MARIA - O Ministério Público Estadual abriu inquérito para apurar se houve improbidade administrativa de funcionários da Prefeitura de Santa Maria e do Corpo de Bombeiros na tragédia que deixou 235 mortos na cidade do interior gaúcho. Para o promotor Cesar Augusto Carlan, "há evidências claras" de que houve falha na fiscalização da boate Kiss, que tinha as licenças sanitária, expedida pela Vigilância Sanitária, e de prevenção contra incêndios vencidas.



Evelson de Freitas/AE
Centenas de manifestantes - a maioria jovens - voltaram às ruas de Santa Maria para pedir Justiça

Além desses dois alvarás, o de localização, emitido pela prefeitura em 14 de abril de 2010 (e concedido uma única vez aos estabelecimentos em Santa Maria), foi apresentado na terça-feira, 29, pelo prefeito César Schirmer (PMDB).

Segundo ele, o local foi vistoriado por dois agentes em abril do ano passado, que não encontraram problemas - apesar de o local ter passado por uma reforma entre dezembro de 2011 e janeiro de 2012 que aumentou a área em 234 metros quadrados. Os dois devem prestar depoimento à polícia até sexta-feira.

"O estabelecimento, para nós, não tinha irregularidades. Se alguma providência ou fiscalização deveria ter sido feita, tinha de ter sido feita pelos bombeiros. Não tínhamos como fechar o lugar", afirmou o prefeito.

Na primeira coletiva concedida na terça-feira após o incêndio, Schirmer e seus secretários não souberam informar por que a boate nunca foi fiscalizada em quase três anos de funcionamento - o próprio alvará de localização só é válido mediante vistorias anuais.

Eles responsabilizaram os bombeiros pela falta de fiscalização no local - o alvará dado pelo Corpo de Bombeiros venceu em agosto do ano passado.

"Os agentes nossos que fizeram a vistoria em abril vão ser punidos se viram irregularidades e não nos informaram. Nós respeitamos a lei, o alvará dos bombeiros estava vencido e eles deveriam ter feito e fiscalização", argumentou o secretário de Governo, Giovani Manica. "Não temos autoridade para fechar a boate", declarou o prefeito, que não quis responder a perguntas da imprensa após ler seu discurso.

Em entrevista coletiva em Porto Alegre, o governador Tarso Genro disse que a Kiss "não poderia estar funcionando de jeito nenhum". A declaração de Tarso vai contra a versão do comando dos bombeiros, de que a Kiss poderia estar em operação, mesmo com o plano contra incêndio vencido desde 14 de agosto de 2012, porque esse alvará estaria em processo de renovação.

Em nota divulgada na terça-feira à noite em seu site, a Polícia Militar gaúcha diz que a lotação da Kiss era de 691 pessoas - estima-se que 1,5 mil estavam no local na hora do incêndio. Também informa que havia duas saídas de emergência na casa, mas elas "não estavam desobstruídas".

Até as 23h30 de terça, os alvarás concedidos pelos bombeiros à boate não estavam nas mãos nem do Ministério Público nem do delegado Marcelo Arygoni, responsável pelo inquérito que investiga as causas do maior incêndio do País em 50 anos. "Nada dos bombeiros ainda chegou para nós, só a documentação da Prefeitura, o que mostra que o alvará de funcionamento estava realmente vencido", disse Arygoni.

O delegado e o promotor vão ouvir agora agentes dos bombeiros que vistoriaram a boate e secretários municipais responsáveis pelos departamentos de fiscalização do comércio. "Apurar se houve uma possível responsabilidade de agentes públicos (na tragédia) é o nosso objetivo agora", disse Carlan.

Indenização. Os defensores públicos do Estado João Paz e Andrei Melo afirmam que a responsabilização de agentes públicos na tragédia de Santa Maria poderá acelerar o processo para pedir indenização para famílias de mortos e feridos. Eles já conseguiram o bloqueio de bens dos dois donos da boate, em ação cautelar.

SINTOMAS DE PNEUMONIA


 
Estadão.com.br  30 de janeiro de 2013 | 10h 21 - Atualizada às 11h29

Sobe para 143 o número de pessoas com sintomas de pneumonia em Santa Maria. Mais 20 frequentadores da boate no dia do incêndio foram hospitalizadas; sinais podem se manifestar até três dias após inalação de fumaça


Ao menos 20 pessoas procuraram os serviços de saúde de Santa Maria e Porto Alegre nos últimos dias com sintomas de pneumonia química, fazendo subir para 143 o número de vítimas internadas após o incêndio na casa noturna Kiss no último domingo. Essas pessoas inalaram a fumaça durante a tragédia, mas não desenvolveram sintomas de intoxicação respiratória imediatamente, como a maior parte das vítimas.


Por enquanto, os novos pacientes estão em observação, pois só apresentam cansaço e falta de ar. Caso o quadro clínico piore, será necessário usar aparelhos para facilitar a respiração. Ao todo, 82 vítimas do incêndio da boate estão internadas em unidades de terapia intensiva (UTIs) nas duas cidades. Dessas, 75 têm estado de saúde considerado crítico, segundo o porta-voz da Força Nacional do Sistema Único de Saúde (SUS), Neio Pereira.

A pneumonia química pode se manifestar até cinco dias depois da inalação de gás tóxico. Tosse, falta de ar e até mesmo catarro frequente, que pode, ou não, estar acompanhado de restos de fuligem, caracterizam as reações do corpo ao desenvolvimento da doença. Se não for tratada corretamente, a moléstia pode levar o paciente à morte. A recomendação é que diante de qualquer sintoma as possíveis vítimas procurem atendimento médico.

O perigo, segundo médicos, é que tecidos internos dos pulmões, lesionados pelo contato com o ar quente do incêndio, comecem a descamar. As células que foram atingidas acabam sendo eliminadas, impedindo o bom funcionamento dos pulmões, o que dificulta a transmissão de oxigênio dos alvéolos pulmonares para a corrente sanguínea. Também pode ocorrer desidratação dos tecidos.

O porta-voz do SUS lembra que há, ainda, a preocupação com os sintomas pós-trauma, que podem atingir as famílias. "O estresse causado pelo trauma muitas vezes demora de 48h a 72h para aparecer. As pessoas começam a entrar em depressão pelo luto, o que é normal. Pessoas que estavam lá dentro e saíram, familiares que começam a apresentar alguns sintomas", explicou o médico.

Equipes de psicólogos e psiquiatras, inclusive voluntários, estão à disposição das famílias 24 horas no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) de Santa Maria. As autoridades de saúde pedem que caso seja observada a necessidade de acompanhamento para pessoas que perderam parentes e amigos na tragédia, elas devem ser levadas ao Caps.

(Com Agência Brasil)

DESPERTADOR NO CONGRESSO


Interrompido um "dolce far niente" entre chamas, fumaça e cadáveres
 WANDERLEY SOARES, O SUL, 30/01/2013


Membros do Congresso Nacional, com a tragédia de Santa Maria, foram acordados para o fato de que o Brasil não tem uma legislação nacional de proteção contra incêndio. Outras tragédias que ocorreram no País, inclusive em Porto Alegre, não tiveram força suficiente para tirar suas excelências de um "dolce far niente" entre chamas, fumaça e cadáveres. Evidentemente que estruturas preventivas, rigorosamente eficientes contra incêndios, pesa significativamente sobre os custos de obras imobiliárias da menor a de maior dimensão. Nisso está um jogo de poder e de dinheiro, o que resulta no absurdo da inexistência de uma legislação direcionada à vida dos cidadãos. O Poder Público, quando se discute segurança pública, se concentra num mantra que procura adormecer a consciência de incautos: "violência e criminalidade são males próprios da humanidade." Olvida, dolosamente, o governante que a irresponsabilidade de quem dirige uma comunidade está no campo da violência.
Rotina de emergência
Tudo o que deveria ser uma rotina do Poder Público, incluso o Ministério Público, passa a ser feito em caráter emergencial, na Capital e no interior do Estado, depois da tragédia de Santa Maria. Sugiro que não esqueçam das salas de cinema e de que algumas arapucas funcionam durante o dia.
Espelunca
Se bem lembro, lá pelo final do governo Germano Rigotto, apontei um antro de entretenimento que funcionava no litoral gaúcho sem o alvará dos bombeiros e que chegava a reunir sete mil jovens. O dono da espelunca - se não tem alvará, a casa nada mais é do que uma espelunca - não gostou, mas rapidamente providenciou em quebrar o seu galho.
Truque do 99
Casas comerciais oferecem mercadorias diversas com o truque do 99. A ideia foi institucionalizada desde o advento das pequenas lojas de R$ 1,99 e que tem prolongamento definitivo, paralelo a sempre presente propaganda enganosa, em estabelecimentos de grande porte. Ocorre que não existe moeda de um centavo.
Dieta
A salada mista que mistura o público com o privado, tão ao gosto da mesa de alguns poderosos, que resulta em despesas para o erário, nada mais é do que crime de improbidade. Cabe ao Ministério Público, com seus mil olhos, a formalização das denúncias.
Porte de incêndio
Um homem saca de sua pistola e faz disparos a esmo e causa mortes. A autoridade ameniza o episódio ao revelar que o pistoleiro se encaminhava para a polícia para renovar seu porte de arma. A partir disso, interpreto a declaração do coronel, professor e intelectual Sérgio Roberto Abreu. Segundo ele, que ainda é comandante-geral da Brigada Militar, a boate Kiss poderia seguir em funcionamento, pois encaminhara um plano para assegurar as festinhas da casa. O governador Tarso Genro desautorizou a palavra de seu comandado. No entanto, o que foi dito está dito.