ZERO HORA 13 de junho de 2013 | N° 17461
SANTA MARIA, 27/01/2013
Inquérito minimiza falhas de bombeiros
HUMBERTO TREZZI E ROBERTO AZAMBUJA
Pelo menos 44 PMs foram investigados, 699 pessoas ouvidas e quase 7 mil páginas preenchidas na apuração feita pela Brigada Militar sobre o incêndio que matou 242 pessoas na boate Kiss, em Santa Maria, em 27 de janeiro. Mas os familiares das vítimas estão frustrados. Apenas oito policiais foram indiciados no Inquérito Policial Militar (IPM) concluído ontem pela BM. E todos por delitos periféricos. Caso algum bombeiro seja condenado, não ficará na cadeia. A pena mais longa prevista é detenção de até três anos. Nenhum integrante da corporação foi apontado como causador da maior tragédia gaúcha. Entre as falhas que o IPM atribui aos militares está a falta de fiscalização do treinamento dos funcionários da danceteria para combate ao fogo e o fato de o comandante ter permitido que um subordinado tivesse empresa privada e inclusive realizasse obras na casa noturna.
– Os erros constatados pelas vistorias não causaram o efeito morte. A tragédia aconteceu por obras feitas pelos proprietários da boate – disse o coronel Flávio da Silva Lopes, encarregado do IPM, cujo desfecho foi divulgado ontem, no Quartel-General da BM.
O IPM concluiu que as principais causas da tragédia foram a presença de barras de contenção de metal na saída da Kiss (para impedir que clientes deixassem a boate sem pagar) e a colocação de espuma anti-acústica feita de material tóxico, que causou intoxicação mortal. Essas duas instalações foram feitas pelos donos do estabelecimento, ressalta o coronel Flávio, sem conhecimento dos bombeiros.
– Esses militares não podem ser responsabilizados pelas mortes – complementou.
Mesmo o fato de a boate só ter uma entrada e saída (a mesma) foi isentado no IPM. O inquérito diz que a norma 9.077 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) não obriga que a saída e a entrada sejam em paredes opostas do prédio.
– É necessário que sejam grandes o suficiente para escoar o público em pouco tempo. Pela lei, portanto, as portas da Kiss estavam regulares. O que não poderia ter ali eram as cancelas metálicas – pondera o coronel Flávio.
Trocando em miúdos: o prédio que o secretário da Segurança Pública, Airton Michels, definiu como uma “arapuca” após sobrevoar Santa Maria para a BM precisaria apenas de pequenas adequações para seguir funcionando como boate.
O IPM admite que o alvará de funcionamento da boate expirou em agosto de 2012 (seis meses antes da tragédia), mas informa que os bombeiros estavam programados para fazer a vistoria – ela estava em 515º lugar numa lista de 2.051 prédios a serem vistoriados em Santa Maria. E a equipe de fiscais é pequena.
O relatório do IPM tampouco critica o fato de o alvará de funcionamento da boate ter sido concedido com base em um documento simplificado de inspeção, o Sistema Integrado de Gestão de Prevenção de Incêndio (SIG-PI). Ou seja, o IPM avaliza esse mecanismo, criado pelos próprios bombeiros para acelerar e simplificar vistorias de estabelecimentos públicos. A conclusão é muito diferente da tirada por engenheiros e outros especialistas que analisaram o caso. No inquérito sobre a Kiss, a Polícia Civil foi corrosiva:
– “...o sistema SIG-PI teve colaboração para o incêndio que ocorreu na boate Kiss... As falhas do SIG-PI começam com a eliminação da necessidade de um responsável técnico...”.
Parentes das vítimas acompanharam a divulgação do IPM e estenderam faixas no QG da BM. Ildo Toniolo, pai de Leandra Fernandes Toniolo (morta na tragédia), resumiu da seguinte forma o sentimento dos familiares:
– Somente as famílias das 242 vítimas estão sendo condenadas e pagarão as penas pelo resto de suas vidas.
OS PRÓXIMOS PASSOS. O que vai acontecer com o IPM a partir de agora
- O comando da BM pode aceitar os indiciamentos, reduzir ou pedir mais investigações.
- Depois da análise, o comando envia o IPM ao Ministério Público Militar.
- Os bombeiros que não foram indiciados ficam isentos de responsabilização por crime militar, a não ser que sejam novamente incluídos pelo comando da BM ou pelo MP Militar.
- Na esfera civil, os bombeiros (independentemente de terem sido indiciados ou não) podem responder por improbidade administrativa, já que um inquérito civil investiga agentes públicos no caso da Kiss.
- Dois bombeiros são réus em processo criminal: o major Gerson da Rosa Pereira e o sargento Renan Severo Berleze são acusados de fraude processual por terem inserido documentos que não estavam no Plano de Prevenção e Combate a Incêndio (PPCI) da Kiss. O caso deles foi separado do processo principal sobre o incêndio e ainda não oficializado em um novo processo.
SANTA MARIA, 27/01/2013
Inquérito minimiza falhas de bombeiros
HUMBERTO TREZZI E ROBERTO AZAMBUJA
Pelo menos 44 PMs foram investigados, 699 pessoas ouvidas e quase 7 mil páginas preenchidas na apuração feita pela Brigada Militar sobre o incêndio que matou 242 pessoas na boate Kiss, em Santa Maria, em 27 de janeiro. Mas os familiares das vítimas estão frustrados. Apenas oito policiais foram indiciados no Inquérito Policial Militar (IPM) concluído ontem pela BM. E todos por delitos periféricos. Caso algum bombeiro seja condenado, não ficará na cadeia. A pena mais longa prevista é detenção de até três anos. Nenhum integrante da corporação foi apontado como causador da maior tragédia gaúcha. Entre as falhas que o IPM atribui aos militares está a falta de fiscalização do treinamento dos funcionários da danceteria para combate ao fogo e o fato de o comandante ter permitido que um subordinado tivesse empresa privada e inclusive realizasse obras na casa noturna.
– Os erros constatados pelas vistorias não causaram o efeito morte. A tragédia aconteceu por obras feitas pelos proprietários da boate – disse o coronel Flávio da Silva Lopes, encarregado do IPM, cujo desfecho foi divulgado ontem, no Quartel-General da BM.
O IPM concluiu que as principais causas da tragédia foram a presença de barras de contenção de metal na saída da Kiss (para impedir que clientes deixassem a boate sem pagar) e a colocação de espuma anti-acústica feita de material tóxico, que causou intoxicação mortal. Essas duas instalações foram feitas pelos donos do estabelecimento, ressalta o coronel Flávio, sem conhecimento dos bombeiros.
– Esses militares não podem ser responsabilizados pelas mortes – complementou.
Mesmo o fato de a boate só ter uma entrada e saída (a mesma) foi isentado no IPM. O inquérito diz que a norma 9.077 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) não obriga que a saída e a entrada sejam em paredes opostas do prédio.
– É necessário que sejam grandes o suficiente para escoar o público em pouco tempo. Pela lei, portanto, as portas da Kiss estavam regulares. O que não poderia ter ali eram as cancelas metálicas – pondera o coronel Flávio.
Trocando em miúdos: o prédio que o secretário da Segurança Pública, Airton Michels, definiu como uma “arapuca” após sobrevoar Santa Maria para a BM precisaria apenas de pequenas adequações para seguir funcionando como boate.
O IPM admite que o alvará de funcionamento da boate expirou em agosto de 2012 (seis meses antes da tragédia), mas informa que os bombeiros estavam programados para fazer a vistoria – ela estava em 515º lugar numa lista de 2.051 prédios a serem vistoriados em Santa Maria. E a equipe de fiscais é pequena.
O relatório do IPM tampouco critica o fato de o alvará de funcionamento da boate ter sido concedido com base em um documento simplificado de inspeção, o Sistema Integrado de Gestão de Prevenção de Incêndio (SIG-PI). Ou seja, o IPM avaliza esse mecanismo, criado pelos próprios bombeiros para acelerar e simplificar vistorias de estabelecimentos públicos. A conclusão é muito diferente da tirada por engenheiros e outros especialistas que analisaram o caso. No inquérito sobre a Kiss, a Polícia Civil foi corrosiva:
– “...o sistema SIG-PI teve colaboração para o incêndio que ocorreu na boate Kiss... As falhas do SIG-PI começam com a eliminação da necessidade de um responsável técnico...”.
Parentes das vítimas acompanharam a divulgação do IPM e estenderam faixas no QG da BM. Ildo Toniolo, pai de Leandra Fernandes Toniolo (morta na tragédia), resumiu da seguinte forma o sentimento dos familiares:
– Somente as famílias das 242 vítimas estão sendo condenadas e pagarão as penas pelo resto de suas vidas.
OS PRÓXIMOS PASSOS. O que vai acontecer com o IPM a partir de agora
- O comando da BM pode aceitar os indiciamentos, reduzir ou pedir mais investigações.
- Depois da análise, o comando envia o IPM ao Ministério Público Militar.
- Os bombeiros que não foram indiciados ficam isentos de responsabilização por crime militar, a não ser que sejam novamente incluídos pelo comando da BM ou pelo MP Militar.
- Na esfera civil, os bombeiros (independentemente de terem sido indiciados ou não) podem responder por improbidade administrativa, já que um inquérito civil investiga agentes públicos no caso da Kiss.
- Dois bombeiros são réus em processo criminal: o major Gerson da Rosa Pereira e o sargento Renan Severo Berleze são acusados de fraude processual por terem inserido documentos que não estavam no Plano de Prevenção e Combate a Incêndio (PPCI) da Kiss. O caso deles foi separado do processo principal sobre o incêndio e ainda não oficializado em um novo processo.
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