Este Blog retratará o descaso com a Defesa Civil no Brasil; a falta de políticas específicas; o sucateamento dos Corpos de Bombeiros; os salários baixos; a legislação ambiental benevolente; a negligência na fiscalização; os desvios de donativos e recursos; os saques; a corrupção; a improbidade; o crime organizado e a inoperância dos instrumentos de prevenção, controle e contenção. Resta o sofrimento das comunidades atingidas, a solidariedade consciente e o heroísmo daqueles que arriscam a vida e suportam salários miseráveis e péssimas condições de trabalho no enfrentamento das calamidades e sinistros que assolam o povo brasileiro.

domingo, 3 de março de 2013

A VOZ DO RUÍDO

ZERO HORA 03 de março de 2013 | N° 17360. ARTIGOS

 Flávio Tavares*


O povo de Santa Maria entendeu, inigualavelmente bem, que o horror não se esquece e que só a resistência ao crime nos salvará do crime. No primeiro mês da tragédia que matou 239 jovens, os santa-marienses usaram o barulho para mostrar que estão vigilantes. Fizeram dobrar os sinos das igrejas, tocaram buzinas, bateram palmas para o ruído exigir que a investigação chegue a todos os responsáveis. Se fizessem passeatas silenciosas, como nos primeiros dias, seriam entendidos apenas no luto, não no protesto. Num país de grandes criminosos impunes (em que governantes e assaltantes se misturam), mostraram que estão vigilantes para impedir as velhas trapaças “legais” em que o delito fica acima da lei e enxovalha a Justiça.

O poder da memória deve servir para algo concreto, para sanar erros e abusos. Não bastam comoventes palavras, belas no saudosismo, maravilhosas na nostalgia, perfeitas como exercício literário, mas etéreas. O passado funesto deve conduzir a atos objetivos para que o crime não se repita. Não se pune por punir. Pune-se como exemplo à sociedade. E seja a quem for!

Até hoje, a Alemanha pune os crimes do nazismo e só isto a recuperou do horrendo desastre do hitlerismo!

*

A minuciosa investigação policial vem buscando situar as diferentes situações que levaram à tragédia da boate. Em Santa Maria, porém, ocorreu um crime amplo e profundo, organizado pela incúria e o desleixo, pela volúpia do lucro fácil, pela desorganização administrativa e pela corrupção dos órgãos públicos. A boate foi transformada em arapuca para aprisionar e matar, ainda que ninguém soubesse disso, nem seus autores.

Os dois delegados de polícia que conduzem o inquérito atuam com eficiência, probidade e rigor. Mas, em crime tão extenso assim, pergunto-me se a tarefa não será demasiado pesada para recair apenas neles, mesmo amparados em peritos e no Ministério Público.

As situações extraordinárias exigem medidas extraordinárias ou de choque. E se o governador tivesse instituído uma comissão ampla e interdisciplinar de alto nível, em que juristas, engenheiros, médicos e outros especialistas acompanhassem o trabalho policial?

Além de evitar eventuais lacunas ou cochilos nos passos do inquérito, iríamos às causas profundas da tragédia e do crime!

*

O prefeito de Santa Maria não foi ouvido ao longo do primeiro mês do crime, quando devia estar entre os primeiros a interrogar. E o coronel Melo, comandante dos bombeiros, que no dia do crime saiu a defender, pela TV, todos os possíveis implicados, a começar pelos donos da boate, não merecia, pelo menos, ser advertido pelo governador?

Os bombeiros têm longa tradição de integridade e dedicação humanitária. “Nada do que seja dor nos é alheio”, é seu velho lema, mas agora não foi assim. O major que liberou a boate (hoje coronel da reserva da Brigada) exigiu propinas em outros licenciamentos. Comparadas à habitual corrupção dos políticos, exigia quinquilharias – um computador ou persianas domésticas –, mas suficientes para saber que nem os bombeiros são imunes à podridão.

Além da ganância, a corrupção administrativa foi um dos fatores do maior crime da história do Rio Grande do Sul. Só na Guerra dos Farrapos ou na Revolução Federalista de 1893, houve, de uma só vez, maior número de mortos. Mas lá eram batalhas a lança, com ambos os lados saindo a matar em campo aberto. Agora, a matança encobriu-se no falso manto de uma festa com música e fogos, licenciada pelo poder público.

Acompanhemos Santa Maria no ruído, para não matar a esperança de Justiça.

*JORNALISTA E ESCRITOR

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Se tiverem falhas e improbidades no envolvimento de bombeiros da Brigada Militar, com certeza, estas serão apuradas com rigor pela Corregedoria da Brigada Militar e assim não deixar que se tornem uma injustiça contra oficiais e praças da BM e uma mancha aos altos níveis de credibilidade que o Corpo de Bombeiros mantém junto à população gaúcha e brasileira sejam maculados. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário