Este Blog retratará o descaso com a Defesa Civil no Brasil; a falta de políticas específicas; o sucateamento dos Corpos de Bombeiros; os salários baixos; a legislação ambiental benevolente; a negligência na fiscalização; os desvios de donativos e recursos; os saques; a corrupção; a improbidade; o crime organizado e a inoperância dos instrumentos de prevenção, controle e contenção. Resta o sofrimento das comunidades atingidas, a solidariedade consciente e o heroísmo daqueles que arriscam a vida e suportam salários miseráveis e péssimas condições de trabalho no enfrentamento das calamidades e sinistros que assolam o povo brasileiro.

sexta-feira, 29 de março de 2013

O FOGO NO TAIM

ZERO HORA 29 de março de 2013 | N° 17386 ARTIGOS

Marcelo Dutra da Silva*


O incêndio que ocorre na Estação Ecológica do Taim, apesar das proporções, para a paisagem representa apenas uma grande mancha de perturbação, formada a partir de um evento natural (raio).

É claro que espécies estão sendo atingidas pelo fogo. Mas, para o sistema como um todo, esse não chega a ser um dano de grandes consequências. As áreas úmidas, de maneira geral, apresentam grande resiliência, ou seja, capacidade muito elevada de se autorregenerar.

No caso de incêndios, essa reorganização do sistema é rapidamente ativada e em pou-co tempo vamos ver a área atingida verde e recolonizada.

Outro aspecto importante, que precisa ser considerado, é que para alguns sistemas o fogo é benéfico, por mais estranho que pareça.

Um sistema protegido como o do Taim acumula muita matéria que, submetida ao tempo seco, torna-se de fácil combustão. E, para pegar fogo, basta uma faísca, uma ponta de cigarro, um raio. Por último, esse não é o primeiro incêndio no Taim e talvez isso se torne mais frequente.

É preciso dizer que boa parte do sistema alagado dessa região, ou que permanece encharcado por um longo período, se deve à barreira imposta pela BR-471, que mudou a dinâmica hídrica regional.

Em outras palavras, temos um sistema muito bonito, de alta produtividade, que abriga uma enorme biodiversidade, uma área protegida, talvez uma das unidades de conservação mais importantes do país. Mas que não seria assim se não fosse o efeito barreira produzido pela BR-471.

Então, por conta dessa grande intervenção espacial, muita coisa mudou, não apenas o volume de água, mas com ele a extensão da área sujeita a inundação, o aumento da vegetação de banhado e fauna característica, bem como o aumento na produção e acúmulo de matéria seca. Que é justamente a que fica sujeita ao incêndio, toda vez que o volume de água diminui e o tempo fica seco.

Assim, por qualquer razão, pode pegar fogo e acaba funcionando como uma válvula de escape. Ao mesmo tempo, é fácil perceber que nem tudo é queimado, observe-se que o fogo passa “lambendo” a superfície e vai continuar até onde tiver matéria seca combustível.

De outra parte, talvez devamos aprender a manejar o risco de incêndios em unidades de conservação. Devemos atentar para o acúmulo anormal de matéria seca, particularmente em sistemas gerados como o do Taim, que possivelmente não funcionava assim, não produzia tanta matéria assim, até que a estrada chegou e mudou tudo. Às vezes, aprendemos na tragédia.

*Ecólogo, doutor, professor de Ecologia de Paisagem do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande


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