EDITORIAIS
Estão reunidas as principais evidências de que a tragédia de Santa Maria resultou de um conjunto de negligências. Também é inquestionável que as omissões e transgressões constatadas até aqui caracterizam crimes graves. Resta apenas, a partir das investigações, tipificar os delitos cometidos e apontar seus responsáveis, para que o inquérito seja encaminhado à Justiça e se faça a reparação possível. Até lá, tudo o que não deveria ocorrer já está acontecendo, que é o jogo de empurra entre autoridades municipais e estaduais e a tentativa de politização do caso.
É evidente que os proprietários da boate, os artistas, a prefeitura e os bombeiros terão de se submeter a avaliações da polícia e do Ministério Público, com a decisiva colaboração da imprensa. Negar-se a admitir falhas, tentar transferi-las a outras instituições ou adotar atitudes diversionistas, como vem ocorrendo desde o início das investigações, são posturas que apenas tumultuam as sindicâncias. É óbvio que os proprietários da boate devem ser os primeiros a responder por seus atos. A responsabilidade empresarial, por princípio, independe de ações fiscalizadoras. Qualquer atividade deve se submeter às leis e normas civilizatórias que regulam negócios, relações humanas e todas as formas de convivência coletiva.
A origem da tragédia está, portanto, na conduta inescrupulosa dos que pensaram em obter lucros a qualquer custo. Já está provado que a boate tinha um teto com revestimento de espuma instalado à revelia das normas de segurança e depois da última vistoria pelos bombeiros e que nem mesmo os extintores funcionavam – fora outras sérias deficiências de segurança. Se essas falhas combinadas criaram o ambiente que provocou a tragédia, os órgãos responsáveis pela fiscalização falharam em suas atribuições. É aqui que o setor público aparece, não como investigador, mas agora como investigado. A prefeitura de Santa Maria e os bombeiros, os principais envolvidos nas suspeitas de omissão, não podem, sob o argumento de que defendem os pontos de vista corretos, retardar ou fornecer informações pela metade e tentar ocultar documentos.
Nesse contexto, Ministério Público, imprensa e cidadãos têm que continuar pressionando para que os relapsos e gananciosos sejam responsabilizados e também para que o natural sentimento de revolta da população não derive para linchamentos e injustiças. Uma investigação rigorosa e transparente é o único caminho para evitar mal-entendidos e, na sequência dos desdobramentos da tragédia, contribuir para que se esclareçam outros casos. É no mínimo inusitada, por exemplo, a situação de seis casas noturnas de Porto Alegre que, segundo a prefeitura, funcionam com liminar da Justiça, depois de terem sido interditadas pela fiscalização. A situação das boates deve ser reavaliada, e com urgência, para que nenhuma instituição corra o risco de ser avalista de imprudências como as que levaram à tragédia de domingo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário