Este Blog retratará o descaso com a Defesa Civil no Brasil; a falta de políticas específicas; o sucateamento dos Corpos de Bombeiros; os salários baixos; a legislação ambiental benevolente; a negligência na fiscalização; os desvios de donativos e recursos; os saques; a corrupção; a improbidade; o crime organizado e a inoperância dos instrumentos de prevenção, controle e contenção. Resta o sofrimento das comunidades atingidas, a solidariedade consciente e o heroísmo daqueles que arriscam a vida e suportam salários miseráveis e péssimas condições de trabalho no enfrentamento das calamidades e sinistros que assolam o povo brasileiro.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

ESTÍMULO À OMISSÃO


ZERO HORA 31 de janeiro de 2013 | N° 17329

PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA


Um episódio que está ocorrendo com o ex-vereador Adeli Sell (PT) ajuda a entender por que muitas vezes os funcionários públicos se omitem na hora de interditar bares, restaurantes e boates. Em 2003, ele era secretário da Indústria e Comércio de Porto Alegre e desencadeou uma campanha intensiva de fiscalização, fechando estabelecimentos com documentação irregular ou que ofereciam risco aos frequentadores. Uma das boates, a Zap, na Rua Dona Laura, no Bairro Rio Branco foi fechada diante da constatação de que o alvará da prefeitura tinha sido falsificado por um funcionário da prefeitura. Naquele endereço, a Smic havia autorizado apenas o funcionamento de uma academia de ginástica.

Os proprietários recorreram à Justiça e o desembargador Luiz Felipe Difini concedeu liminar para que a boate abrisse as portas na noite da inauguração. Indignado, Adeli deu entrevistas dizendo que a decisão manchava a imagem do Judiciário gaúcho. “Daqui a pouco, vão pedir uma Operação Anaconda para investigar o Rio Grande do Sul também”, exaltou-se, referindo-se a uma investigação que envolvia corrupção no Judiciário de São Paulo. As declarações provocaram uma crise entre o Judiciário e a prefeitura. Sentindo-se ofendido, Difini processou a prefeitura por dano moral e ganhou uma indenização de R$ 140 mil. Hoje, a prefeitura move ação regressiva para cobrar de Adeli o ressarcimento do dinheiro que gastou para indenizar o desembargador.

A defesa de Adeli alega que a prefeitura não pode cobrar do ex-secretário se, no processo, sustentou a legalidade da ação dele como gestor público, foco da divergência com o magistrado. Naquele ano, Adeli fechou uma série de estabelecimentos que acabaram sendo reabertos por liminar da Justiça.Um deles, a boate Ice, no bairro Auxiliadora, apresentava, segundo Adeli, semelhanças com a Kiss: era um espaço para mais de 2 mil pessoas, com apenas uma porta de saída. Em outra, ocorria uma festa com o portão fechado a cadeado, aumentando o risco dos frequentadores em caso de incêndio.

Na próxima semana, a defesa de Adeli vai apresentar a contestação. Ainda que a indenização por dano moral tenha sido concedida por conta das declarações do então secretário, consideradas ofensivas, a possibilidade de cobrança futura inibe os fiscais. Entre as seis grandes casas noturnas que funcionam em Porto Alegre amparadas por liminar está o Café Moinhos, no mesmo endereço de uma boate interditada há 10 anos por Adeli, o Café do Prado, na Rua Quintino Bocaiúva, Bairro Moinhos de Vento.


ALIÁS

Quando um juiz autoriza, por liminar, a abertura de um estabelecimento que teve alvará negado pela prefeitura está se responsabilizando por eventuais acidentes no local.


MUDOS PARA SEMPRE

Os telefones celulares enfileirados sobre uma mesa na sede da 1ª Delegacia de Polícia de Santa Maria emudeceram depois de tocar insistentemente na madrugada de domingo. Foi para eles que pais, mães, avós, irmãos e amigos ligaram em busca de notícias quando souberam do incêndio na boate Kiss.

Os chips guardam o registro de ligações não atendidas e de mensagens que os destinatários não chegaram a ler. Foi por um deles que a menina Michele Froelich Cardoso, 20 anos, lançou um apelo desesperado pelo Facebook – “Incêndio na KISS socorro” – antes de ser sufocada pela fumaça tóxica.

Ontem, os celulares, as carteiras de identidade, as bolsas e outros objetos recolhidos junto com os corpos das mais de 230 vítimas ou nos destroços da Kiss começaram a ser entregues às famílias.

Mais segurança

No início da tarde de hoje, o prefeito de Canoas, Jairo Jorge, assina decreto criando um grupo de trabalho que terá 60 dias para apresentar um mapeamento da situação de todos os bares, restaurantes e casas noturnas do município.

Desde 2010, a prefeitura tem um sistema integrado de fiscalização que faz batidas nos estabelecimentos para checar se estão com as licenças em dia, mas o prefeito quer mais.

Depois da tragédia de Santa Maria, Jairo Jorge quer ter certeza de que nenhuma casa está desrespeitando as normas de segurança.


Ação de rotina

Na véspera do incêndio que matou 235 pessoas na boate Kiss, em Santa Maria, uma ação de rotina da Secretaria Municipal de Urbanismo de Caxias do Sul, em conjunto com a Brigada Militar, fechou cinco bares que funcionavam sem alvará.

Outros dois foram notificados porque tinham autorização para operar como bar e restaurante, mas funcionavam como casas noturnas.

Amanhã, o secretário de Urbanismo, Fábio Vanin, vai apresentar ao prefeito Alceu Barbosa Velho um relatório das medidas adotadas para aperfeiçoar o trabalho de fiscalização.




Um dia depois de ter evitado identificar as seis casas noturnas que operam amparadas em liminar da Justiça, o prefeito José Fortunati percebeu que não tinha como adiar a divulgação da informação. Além de liberar os nomes, prometeu dar transparência às ressalvas da fiscalização e ao conteúdo das liminares dos juízes.

Ontem, Fortunati reuniu os secretários envolvidos com licenciamentos para discutir ações que garantam maior segurança.


Missão da Assembleia

Qualquer mudança na legislação sobre prevenção de incêndios precisa passar pela Assembleia Legislativa. É por isso que a tragédia de Santa Maria será tratada pelo presidente que assume hoje, o deputado Pedro Westphalen (PP).

O novo presidente quer começar enfrentando os problemas domésticos: vai proibir o uso de fogos de artifício no interior do prédio, incluindo o Teatro Dante Barone.

Outra promessa é melhorar as condições de segurança do Palácio Farroupilha, por onde circulam 4 mil pessoas por dia. Faltam escadas externas.



Disputa na comissão

A comissão criada na Câmara dos Deputados para acompanhar as investigações da tragédia de Santa Maria corre o risco de se perder na poeira das disputas partidárias.

Como o deputado Paulo Pimenta (PT) foi escolhido para ser o presidente, Nelson Marchezan Jr. (PSDB) pediu para ser o relator. Recebeu a informação de que essa tarefa deverá ficar com uma deputada do Pará.

– Para funcionar, essa não pode ser uma comissão do PT – diz Marchezan, que tem base eleitoral em Santa Maria.

Mesmo sem cargo, ele vai acompanhar a investigação.


Tartaruga

Além da demora na indicação do relator, Nelson Marchezan estranha que a primeira reunião tenha ficado para a semana que vem:

– Deveríamos estar acompanhando as investigações. Marcar a primeira reunião para a semana que vem, às vésperas do Carnaval, é inexplicável.


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