Este Blog retratará o descaso com a Defesa Civil no Brasil; a falta de políticas específicas; o sucateamento dos Corpos de Bombeiros; os salários baixos; a legislação ambiental benevolente; a negligência na fiscalização; os desvios de donativos e recursos; os saques; a corrupção; a improbidade; o crime organizado e a inoperância dos instrumentos de prevenção, controle e contenção. Resta o sofrimento das comunidades atingidas, a solidariedade consciente e o heroísmo daqueles que arriscam a vida e suportam salários miseráveis e péssimas condições de trabalho no enfrentamento das calamidades e sinistros que assolam o povo brasileiro.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

SOLIDARIEDADE DO TAMANHO DO PAÍS

28 de janeiro de 2013 | N° 17326

SANTA MARIA, 27/01/2013


CARLOS ROLLSING, Colaborou Cláudia Lawisch

A escuridão da madrugada pairava sobre o Rio Grande do Sul quando foi deflagrada a mobilização nacional de socorro às vítimas da tragédia na boate Kiss, em Santa Maria. Junto com a aurora, as primeiras aeronaves partiram de Porto Alegre rumo ao centro do Estado. A missão não dava margem para esperanças: profissionais e autoridades que embarcavam na Capital já tinham noção da carnificina.

A ação foi organizada pelo secretário da Segurança, Airton Michels, que costurou o auxílio da Aeronáutica na operação. Quatro aeronaves da Brigada Militar e nove da Força Aérea Brasileira (FAB) iniciaram o transporte de bombeiros, policiais militares, médicos, enfermeiros, equipamentos de socorro, sobretudo respiradores, e cães farejadores – utilizados nas buscas por corpos em meio ao escombros da boate. O avião oficial do governador Tarso Genro, antes de levá-lo à cidade, também foi utilizado no transporte de equipes de socorro. As comitivas se somavam aos profissionais baseados na região de Santa Maria.

Parte majoritária dos reforços seguiu para o Hospital da Caridade. Os poucos leitos disponíveis foram rapidamente ocupados por sobreviventes da Kiss, o que obrigou médicos a improvisarem duas UTI’s no local.

– Chegaram 30 pacientes críticos de uma só vez, mas não enfrentamos escassez de leitos. Tivemos problemas devido ao número de respiradores. Mas, logo no início da manhã, chegaram 12 desses equipamentos de Porto Alegre. A ajuda veio de todo o Estado – relatou Cláudio Azevedo, anestesista que coordenou a operação no Hospital da Caridade.

À tarde, pousaram na cidade dois dos maiores aviões de carga da FAB, um do Rio de Janeiro e outro de Campo Grande, para auxiliar no transporte de vítimas de Santa Maria – onde não havia mais lugar para manter jovens com intoxicação pulmonar e edemas nas vias aéreas causadas pela fumaça. Eles eram transferidos para hospitais como o Pronto Socorro, Clínicas e Moinhos de Vento, em Porto Alegre.

A rede estadual do Samu se integrou à operação. Dezenas de UTIs móveis foram enviadas de Caxias do Sul, Canoas, Passo Fundo, Ijuí, Santo Ângelo e Porto Alegre.

A comoção tomou a população, que, por meio das redes sociais, passou a se engajar em campanhas de donativos. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, explicou que, apesar de solidário, o gesto era desnecessário. As urgências gritantes eram por leitos hospitalares e transporte ágil, algo inalcançável para a população.

O espaço aéreo foi tomado por aeronaves. Pela manhã, a repórter Rosane Marchetti, da RBS TV, viajou em um helicóptero da Unimed, junto com o piloto, uma médica e outra enfermeira. Consternados, voavam em silêncio para resgatar um sobrevivente, segurado do plano de saúde.

– No caminho, avistamos muitos helicópteros. O céu estava muito movimentado – contou Rosane.

Quem chegava na cidade, percebia que o habitual silêncio de um amanhecer de domingo havia sido substituído pelo insistente e perturbador barulho de sirenes de ambulâncias.

Instituições estiveram constantemente presentes no socorro. O Conselho Regional de Psicologia destacou duas profissionais para prestar atendimento aos familiares, obrigados a encarar fileiras de cadáveres estendidos no chão para fazer o reconhecimento.

Outras quatro psicólogas da Associação Brasileira de Emergências e Desastres viajaram de São Paulo a Caxias do Sul, e depois a Santa Maria, para reconfortar uma comunidade traumatizada.

Diversos órgãos estão em situação de alerta. Ontem à noite, a diretora da Central de Transplantes do Estado, Rosana Nothen, esteve reunida em Santa Maria com o secretário da Saúde, Ciro Simoni.

– Ainda é muito prematuro para falar qualquer coisa, mas vamos verificar o que é necessário – resumiu a diretora.

A mobilização continua hoje. O Hemocentro de Porto Alegre irá coletar sangue. O mesmo irá ocorrer na Região Central do Estado. Tudo para atenuar a dor de uma ferida que jamais irá cicatrizar.

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